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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Artigos: Modernismo



Sentido do Modernismo

O termo Modernismo – e tudo aquilo que ele significa – não pode ser abordado numa perspectiva exclusivamente nacional. Devemos então considerá-lo sob dois ângulos:


Origens 

Nas três primeiras décadas do século XX, as principais nações européias vivem uma impressionante revolução artística, atingindo todos os setores criativos, e que - a grosso modo - recebe o nome de Arte Moderna ou Modernismo. Esta revolução se expande rapidamente e alcança um incontável número de países extra-europeus, entre os quais o Brasil. O crítico Otto Maria Carpeaux delimita a cronologia dessas transformações

Aquilo que entendemos por "arte moderna" já se presentificara na primeira década do século XX, mas sua expansão e vitalidade deu-se na segunda década, quando a guerra, as crises sociais e existenciais, a Revolução na Rússia, o fim do grande ciclo burguês, favoreceram o desenvolvimento de uma arte polêmica e destruidora. Por romper com uma série de cânones, essa arte recebeu o nome de vanguarda, a que está a frente de seu tempo. 
Podemos especular que as vanguardas teriam acontecido de qualquer maneira, independentemente das circunstâncias históricas, mas os vertiginosos acontecimentos da Primeira Guerra Mundial e da Revolução Soviética aceleram, com certeza, a ruptura e a radicalização, tanto ideológica quanto estética, de uma série de movimentos inovadores.
 

Características da Literatura Modernista
  • liberdade nos temas e da linguagem
  • valorização do cotidiano
  • liberdade de expressão
  • ambigüidade
  • destruição dos nexos
  • verso livre  
Liberdade de Expressão
 
A importância maior das vanguardas residiu no triunfo de uma concepção inteiramente libertária da criação artística. O pintor, o escritor ou o músico não precisam se guiar por outras leis que não as de sua própria interioridade e de seu próprio arbítrio. Picasso não pintará mais o real e sim a sua interpretação do real. Compositores como Schönberg e Stravinski levarão a música a novos limites, questionando a tonalidade usual.

Incorporação do Cotidiano

Uma das maiores conquistas do modernismo, a valorização da vida cotidiana traz para a arte uma abertura temática sem precedentes, pois, até então, apenas assuntos "sublimes" tinham direito indiscutível ao mundo literário. Agora, o prosaico, o diário, o grosseiro, o vulgar, o resíduo e o lixo tornam-se os motivos centrais da nova estética. À grandiosidade da paisagem, Manuel Bandeira sobrepõe a humildade do beco:

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?
- O que eu vejo é o beco.
Linguagem Coloquial   

Este anticonvencionalismo temático, esta dessacralização dos conteúdos encontra correspondência na linguagem. Além das inovações técnicas, a linguagem torna-se coloquial, espontânea, mesclando expressões da língua culta com termos populares, o estilo elevado com o estilo vulgar. Há uma forte aproximação com a fala, isto é, com a oralidade.

A língua sem arcaísmos. Sem erudição. Natural e neológica. A contribuição milionária de todos os erros.
Também Manuel Bandeira admite a contribuição da linguagem popular:
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil (...)
Inovações Técnicas

O rompimento com os padrões culturais do século XIX implicaria no aparecimento de novas técnicas, tanto no domínio da poesia, quanto no da ficção. As principais conquistas foram:

Versos livres 

O verso já não está sujeito ao rigor métrico e às formas fixas de versificação, como o soneto, por exemplo. Também a rima se torna desnecessária. Vejamos um trecho de Consideração do poema, de Carlos Drummond de Andrade:

Não rimarei a palavra sono
com a incorrespondente palavra outono.
Rimarei com a palavra carne
Ou qualquer outra, todas me convêm.
Destruição dos nexos 

Os chamados nexos sintáticos, preposições, conjunções, etc., são eliminados da poesia moderna, que se torna mais solta, mais descontínua e fragmentária e, fundamentalmente, mais sintética. Veja-se um exemplo radical no poema Coca cola, do concretista Décio Pignatari:

beba coca cola
babe cola
beba coca
babe cola caco
caco 
cola
cloaca.

Paronomásia  

Figura muito usada depois de 1922, consiste na junção de palavras de sonoridade muito parecida, mas de significado diferente. Murilo Mendes escreve: "As têmporas da maçã, as têmporas da hortelã, as têmporas da romã, as têmporas do tempo, o tempo temporã." Da mesma maneira, Carlos Drummond é um especialista em paronomásias:

"Melancolias, mercadorias espreitam-me."
Ambiguidade 
O discurso literário perde o sentido fechado que geralmente possuía no século passado. Ou seja, ele oferecia ao leitor apenas um sentido, uma interpretação. Agora, ele tem um caráter variado e polissêmico. Uma rede de significações, que permite múltiplos níveis de leitura. É a chamada obra aberta, obra que não apresenta univocidade, ou seja, que não se esgota numa única interpretação
Estrela da manhã, de Manuel Bandeira, por exemplo, é um poema representativo do polissenso da literatura contemporânea. No final da leitura, não sabemos com absoluta convicção o que essa estrela simboliza. Uma mulher experiente que o poeta deseja? Uma prostituta? A própria vida a que Bandeira pela doença foi obrigado a abdicar?
Eu quero a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã ?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã
Ela desapareceu ia nua
Desapareceu com quem?
Procurem por toda a parte (…)
Manuel Bandeira (1886-1968) 

Vida

Nasceu no Recife, filho de uma família oligárquica. Começou a fazer o curso de engenharia, em São Paulo, mas a tuberculose o impediu de concluir a faculdade. Buscando a cura, esteve um ano na Suíça, onde efetivamente eliminou a doença. Voltando para o Brasil, tornou-se inspetor de ensino e, depois, professor de Literatura na Universidade do Brasil. 

Obras principais

Cinza das horas (1917); Carnaval (1919); Ritmo dissoluto (1924); Libertinagem (1930); Estrela da manhã (1936); Lira dos cinquent'anos (1948); Estrela da tarde (1963) 

A poesia de Manuel Bandeira - eliminados os resíduos simbolistas e parnasianos de Cinza das horas e Carnaval - enquadrando-se na vertente mais clássica do espírito modernista, aquela em que se processa uma fusão entre a confissão pessoal e a vida cotidiana. Em Bandeira predomina com algumas insistência o lirismo do EU, mas o cotidiano jamais desaparece dos textos, numa síntese feliz entre subjetividade e objetividade. Isto se dá porque uma relação dialética estabelece-se entre ambos. Assim: 
Poesia = cotidiano mais o eu-lírico.
Nada em sua poesia é mera visão interior. Tampouco lhe apraz a simples fotografia realista do mundo. Mesmo assim, praticou eventualmente uma lírica sem a presença da interioridade. É o caso do Poema tirado de uma notícia de jornal:
João Gostoso era carregador de feira-livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número.

Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro

Bebeu
Cantou
Dançou

Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

Ou, ainda, deste O bicho, infiltrado por grande indignação moral:
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.

O poeta debruça-se sobre o mundo concreto, porém na sua fala sobre o real pode-se pressentir o traço biográfico, como no já antológico Irene:
Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor

Imagino Irene entrando no céu:

- Com licença, meu branco.
   E São Pedro, bonachão:
- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença