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domingo, 20 de outubro de 2013

VIII Colóquio Internacional Michel Foucault

A divisão do percurso intelectual de Michel Foucault em três fases – arqueologia, genealogia e ética/subjetivação – tem orientado diversos eventos brasileiros dedicados a seu pensamento. Essa partição não é inútil, tampouco necessariamente má. Vale dizer, inclusive, que ela dimensionou a organização do encontro que, a posteriori, veio a ser designado como “Primeiro Colóquio Internacional Michel Foucault” – realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em 1999, e publicado um ano mais tarde sob o título Retratos de Foucault.
Naquela ocasião, tanto as mesas redondas, integradas por pesquisadores nacionais e estrangeiros, quanto o próprio livro, foram montados tendo por base um “primeiro” (o da arqueologia do saber), um “segundo” (o da genealogia do poder) e um “último” Foucault (o da ética-estética da existência). Embora Foucault houvesse visitado nosso país por cinco vezes – em 1965, 1973, 1974, 1975 e 1976 – e seus principais livros já tivessem sido publicados por editoras brasileiras – de início com grande atraso, mas, a partir dos anos 1980, celeremente –, em 1999 sequer se imaginava que aquele encontro singular, organizado pela Profa. Vera Portocarrero, despertaria um entusiasmo de tal modo crescente entre pesquisadores, professores e estudantes de vários campos do saber (filosofia, psicologia, psicanálise, direito, educação, história, artes), bem como de trabalhadores dos campos social e da saúde, que redundaria em uma série regular de Colóquios Internacionais e, principalmente, na formação de um grupo brasileiro de “foucaultianos”. Com esse qualificativo, não designamos meros repetidores da “obra do mestre”; referimo-nos àqueles que fazem do pensamento de Foucault uma ferramenta para seus escritos, reflexões e ações nos mais variados âmbitos, acadêmicos ou não – diferenciação que, por sinal, deve ser bastante matizada neste caso.
Certo é que os Colóquios Internacionais e os contatos entre os participantes se multiplicaram e se estreitaram, respectivamente. Seguiram-se seis outros encontros, a intervalos regulares, a saber:
Colóquio Foucault-Deleuze, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH-UNICAMP), em 2000 (II Internacional)
Michel Foucault, 20 anos depois, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH-UNICAMP), em 2004 (III Internacional)
Michel Foucault, cartógrafo: um pensador dos espaços, das margens, dos limites e das fronteiras, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em 2007 (IV Internacional)
Por uma vida não-fascista, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH-UNICAMP), em 2008 (V Internacional)
Michel Foucault: Filosofia e Política, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IFCS-UFRJ), em 2009 (VI Internacional)
O mesmo e o outro: 20 anos de História da Loucura, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em 2011 (VII Internacional).
A fecundidade desses sete encontros fica bem evidenciada não só pelas diversas problematizações que os orientaram – tanto Foucault como os “foucaultianos” partem de problemas-inquietações do presente, e não de grandes esquemas teóricos prévios – como pelo acervo bibliográfico por eles gerado, hoje visto como indispensável a todo aquele que, no Brasil, se interesse pela “ferramentaria Foucault”, como se pode perceber pela listagem abaixo:

PORTOCARRERO, V. e CASTELO BRANCO, G. (orgs.) Retratos de Foucault. Rio de Janeiro: Nau, 2000 (UERJ, 1999)
RAGO, M.; ORLANDI, L.; VEIGA-NETO, A. (orgs.) Imagens de Foucault e Deleuze. Rio de Janeiro: DP&A, 2002 (UNICAMP, 2000)
RAGO, M. e VEIGA-NETO, A. (orgs.) Figuras de Foucault. Belo Horizonte: Autêntica, 2006 (UNICAMP, 2004)
ALBUQUERQUE Jr., D.M.; VEIGA-NETO, A.; SOUZA FILHO, Alípio (orgs.) Cartografias de Foucault. Belo Horizonte: Autêntica, 2008 (UFRN, 2006)
RAGO, M. e VEIGA-NETO, A. (orgs.). Para uma vida não-fascista. Belo Horizonte: Autêntica, 2009 (UNICAMP, 2008).
CASTELO BRANCO, G. e VEIGA-NETO, A. (orgs.) Foucault, filosofia e política. Belo Horizonte: Autêntica, 2011 (UFRJ, 2009)
MUCHAIL, S.T.; FONSECA, M.A. e VEIGA-NETO, A. (orgs.) O mesmo e o outro. Cinquenta anos de História da Loucura. Belo Horizonte: Autêntica, 2013 (PUC-SP, 2011, no prelo).

Com exceção das duas primeiras coletâneas, publicadas pelas editoras cariocas NAU e DP&A, respectivamente, as demais integram a coleção “Estudos Foucaultianos”, da Editora belorizontina Autêntica. Criada em 2008 e dirigida pelo Prof. Alfredo Veiga-Neto, a existência dessa coleção tem contribuído para que, a cada novo Colóquio realizado, seja lançada a obra correspondente ao evento anterior. Com isso, somado às interlocuções frequentes entre os conferencistas convidados (nacionais e internacionais), as discussões sobre (e com) Foucault têm atingido, em nosso país, altos níveis de sofisticação, sem que, por isso, se vejam privadas da qualidade de “óculos voltados para fora” – para aquilo que somos ou estamos em vias de deixar de ser.
O presente projeto, voltado à realização do VIII Colóquio Internacional Michel Foucault, pretende, por um lado, dar continuidade a essa bem sucedida iniciativa de reunir professores, pesquisadores, estudantes e trabalhadores dos campos social e da saúde em torno dos instrumentos fabricados por um pensador tão fecundo quanto perturbador das evidências (e, apesar de bastante falado e difundido, ainda desconhecido por muitos). Por outro lado, o VIII Colóquio possui alguns matizes que o singularizam em relação à série de que faz parte, circunstância de que nos ocuparemos brevemente a seguir.
O título previsto, mediante o qual se pretende circunscrever uma problemática, é “Michel Foucault e os saberes do homem – Como, na orla do mar, um rosto de areia”. Mediante a expressão “saberes do homem”, sugere-se uma duplicidade de sentidos: estarão em pauta tanto os saberes elaborados pelohomem como os saberes que têm o homem como objeto de saber. A frase em itálico, por sua vez, é a que encerra o livro “As palavras e as coisas” (1966), polêmico trabalho em que Foucault previu o desaparecimento, qual uma figura traçada na areia levada pelas ondas do mar, da categoria homemcomo centro de nossas formas (modernas) de pensar, agir e ser. Adicionalmente, a frase traz à cena o local de realização do colóquio: o Rio de Janeiro, situado à beira mar, cidade onde se realizou, como antes mencionamos, o primeiro dos Colóquios Internacionais.
A despeito da referência a “As palavras e as coisas”, o evento não se restringirá aos problemas diretamente focalizados nesse livro. E se o Colóquio retorna à UERJ, não mais pretende apoiar-se, como na primeira realização, na tradicional divisão entre “os 3 Foucaults”. Como dissemos de início, se tal divisão não é necessariamente má, parece hoje – notadamente após a publicação da maioria dos cursos ministrados por Foucault no Collège de France, bem como da coletânea, em 4 volumes, que reúne seus Dits et Écrits –, algo perigosa. Melhor seria dizer que, ao longo de seu percurso intelectual, Foucault elaborou, progressivamente, uma “ontologia histórica de nós mesmos”, caracterizada por três dimensões: epistemológica (o que somos nós, que sabemos tantas coisas sobre diversos domínios da realidade, e em especial sobre nós mesmos?), política (o que somos nós, que agimos sobre nossas próprias ações, procurando governá-las?) e ética (o que somos nós como sujeitos morais que, a partir de determinado momento da história, relegamos o “cuidado de si” a uma posição subordinada, passando a privilegiar o “conhecimento de si”?). Evidentemente interrelacionadas, essas três dimensões (e não tanto “fases” ou “etapas”) abrem campos problemáticos em múltiplos âmbitos – Filosofia, História, Ciências Políticas e Sociais, SaberesPsi, Ciências da Saúde, Educação, Estudos Literários etc. – e facultam por em pauta, ao longo da realização do evento, problemas teóricos e metodológicos de cunho interdisciplinar; mas, primordialmente, questões ético-políticas que assediam intelectuais e trabalhadores sociais no contemporâneo, inclusive (e/ou particularmente) no Estado do Rio de Janeiro. Com tal intuito pretendemos reunir, na qualidade de conferencistas, reconhecidos estudiosos, nacionais e internacionais, do pensamento foucaultiano, a fim de que a problemática acima delineada possa atingir um público amplo e diversificado. O Colóquio deverá realizar-se em 4 dias, contando com uma mesa de abertura e 8 mesas redondas, cada uma delas integrada por 4 conferencistas reunidos em torno de um foco temático comum, conforme se verá explicitado na Programação completa.
Cumpre finalmente destacar, para além do retorno ao espaço da primeira iniciativa, a relevância de realizar este VIII Colóquio Michel Foucault na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A UERJ ocupa uma posição estratégica nos âmbitos do ensino, da pesquisa e da extensão, por sua situação geográfica, social e política. Atende, nesses três âmbitos, a toda a população do Estado, favorecendo, em acréscimo, a difusão nacional e internacional de suas realizações culturais. Sendo assim, o Colóquio deverá atrair interessados da cidade, do Estado e, inclusive, do restante do país, como vem acontecendo a cada uma de suas versões.

Programação


Dia 22/10/2013 (terça-feira)

13 horas – Mesa de abertura, com uma autoridade universitária e as organizadoras (Vera Portocarrero e Heliana de Barros Conde Rodrigues).

13:30 às 15:30 – Mesa Redonda 1: Um filósofo que não precisou dizer seu nome
Silvio Gallo. Das verdades do homem: em torno de um “pós-humanismo” de Foucault
Walter Omar Kohan. Michel Foucault: a coragem da filosofia como vida
César Candiotto.Política, Filosofia e Subjetivação em M. Foucault
Acácio Augusto.O conhecimento sobre o Homem, o ‘novo homem’ e o combate à humanidade

15:30 às 16 – Pausa para o café

16 às 18 – Mesa Redonda 2: Luzes e sombras da infâmia
José Gondra. ‘Deixar viver’ e as (des)ordens do desejo – Notas sobre o infanticídio no Brasil
Fabio Henrique Lopes. Modos ‘queer de ser? Travestilidade, biopolítica e estéticas da existência
Salete Oliveira. Política, psiquiatria do desenvolvimento e resiliência: breves fissuras em notas para abolição do regime do castigo
Estela Scheinvar. Saberes desvanecentes? Movimentos pela garantia de direitos de crianças e jovens

18:30 às 19:30 – Atividade Cultural

Dia 23/10/2013 (quarta-feira)

13:30 às 15:30 – Mesa Redonda 3: O homem e seus signos
José Ternes. Efêmero ‘rosto de areia’
Jorge Dávila. Genealogia do humanismo e ética do errante
Marcio Alves da Fonseca. A população entre a ordem da representação e a ordem da história
Dirce Eleonora Nigro Solis. O sonho e o sono antropológico a partir de Michel Foucault: estado atual da questão

15:30 às 16 – Pausa para o café

 16:00 às 18:00 – Mesa Redonda 4: Para além do silêncio, a eclosão dos saberes das mulheres
Tânia Navarro Swain. Maneiras de apagar as mulheres da memória social : o “homem” universal
Margareth Rago. Foucault, a crítica feminista e os muitos rostos de Cindy Sherman
Denise Bernuzzi Sant´Anna. A coisa
Salma Tanus Muchail. Notícias de Hipátia

18:30 às 19:30 – Lançamento de livros e coquetel

Dia 24/10/2013 (quinta-feira)

13:30 às 15:30 – Mesa redonda 5: Entre os psi: acolhendo pirotecnias
Pierangelo Di Vittorio. Um Foucault “menor”? O desafio ético de “História da Loucura” a “A coragem da verdade”
Arthur Arruda Leal Ferreira. Técnicas de governo e práticas psicológicas. A gestão entre a determinação e a liberdade
Joel Birman. As leituras de Foucault da Psicanálise, nas suas proximidades e diferenças com a Psiquiatria e a Medicina
Paulo Amarante. Basaglia e Foucault. O otimismo da prática e o otimismo da razão

15:30 às 16 – Pausa para o café

16 às 18 – Mesa Redonda 6: Ditos, escritos, imagens e derivas
André Duarte (co-autora: Maria Rita de Assis César). Foucault e o pensamento-escritura como experiência (política) transformadora
John Rajchman. Foucault e as Artes
André Berten. Foucault, Habermas: filosofia e literatura
Philippe Artières. O amotinado fotografado, um acontencimento foucaultiano

18:30 às 19:30 – Atividade cultural

Dia 25/10/2013 (sexta-feira)

13:30 às 15:30 – Mesa Redonda 7: Clio despedaçada?
Durval Muniz de Albuquerque Jr. Mãe Velha e Silenciosa: o lugar e a relação da História no/com o nascimento das ciências do Homem
Ernani Chaves. Foucault, Marx e o marxismo
Marilene Rosa Nogueira da Silva (co-autora: Magda Maria Jaolino Torres). Michel Foucault e a disciplina da história – a’ palavra’ e as ‘coisas’
José Luis Câmara Leme. ‘Tempestade num copo de água’. Ricardo, Marx e o Fim da História segundo M. Foucault

15:30 às 16 – Pausa para o café

16 às 18 – Mesa Redonda 8: Das liberdades: topos, utopos, heterotopos
Edson Passetti. Percursos heterotópicos. Resistências, verdades e estéticas de existências
Paulo Vaz. Normalização e subjetividade moderna
Edgardo Castro. Para além da biopolítica, governo e veridição
Alfredo Veiga-Neto (co-autora: Maura Corcini Lopes). Focos de experiência e contraconduta: ferramentas para problematizar as políticas e práticas de inclusão social

18:30 às 19:00 – Breve encontro de encerramento e despedidas