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quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Brasil detêm 80% dos casos de paracoccidioidomicose



O lançamento do documentário Paracoco: uma endemia brasileira, na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, foi marcado por palestras que apresentaram aspectos da paracoccidioidomicose, doença endêmica e negligenciada na América Latina. Na ocasião, o diretor da ENSP, Hermano Castro, falou sobre pneumopatias e poluição do ar – diferencial de tuberculose e micoses sistêmicas. Em sua palestra, explicou que existem algumas semelhanças, do ponto de vista clínico, entre a tuberculose e a paracoccidioidomicose, capazes de causar confusão e fazer que inicialmente boa parte dos casos desta doença sejam diagnosticados como TB. O diretor destacou também a suscetibilidade dos trabalhadores a ambas as doenças e citou que existe uma associação de até 10% entre TB e paracoco, dependendo do tipo de atividade desenvolvida pelo trabalhador.





Além do diretor da Escola, estiveram presentes na atividade – realizada no Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria, em 21/11 – os pesquisadores Bodo Wanke (Ipec/Fiocruz) e Ziadir Coutinho (ENSP/Fiocruz), que falaram sobre clínica, diagnóstico e tratamento da paracoccidioidomicose e a morbimortalidade causada por essa doença no Brasil, respectivamente, e o diretor do filme Eduardo Thielen (Icict/Fiocruz).

Para Hermano Castro, a transmissibilidade é uma das principais diferenças na cadeia epidemiológica entre tuberculose e paracoccidioidomicose. Segundo ele, existe uma lista com cerca de 40 doenças de fibrose pulmonar na qual todas elas são possibilidades de diagnóstico inicial para a paracoco. “O importante na avaliação é a história pregressa, a história da exposição do indivíduo. Na imagem pulmonar não há muitas diferenças. Existe uma imagem característica, uma lesão central, denominada 'asa de borboleta'. No entanto, há muitas doenças pulmonares que exibem esse mesmo padrão”, considerou. Hermano apontou também a comorbidade da paracoccidioidomicose com o HIV. Em seguida, ele ponderou que não existem muitos estudos que relacionam a doença com o trabalho.

Em 2012, publicou-se uma pesquisa que fazia uma associação entre paracoco e trabalho. O estudo trazia uma amostra de 166 trabalhadores, dois quais 50% deles eram trabalhadores rurais. “Existe uma gama enorme de atividades profissionais que podem estar vinculadas a paracoccidioidomicose e que deveriam estar no mesmo caminho das doenças ocupacionais, com todos os benefícios que a lei acidentária garante. No entanto, isso não existe. Pesquisando nos dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), não há informação sobre afastamento de trabalhador por paracoco. Há por várias outras doenças, mas por paracoccidioidomicose ocupacional não há afastamento pelo INSS."

Finalizando, Hermano Castro apresentou um caso de grande confusão diagnóstica da doença, no qual o doente passou por diversos diagnósticos até chegar na paracoco, e enfatizou que esse é o cenário do diagnóstico e tratamento da doença atualmente no Brasil. “Do ponto de vista da saúde pública, é preciso retomar uma discussão de que a epidemiologia dá o tom e a tônica do processo de doença. Ela define o caminho a seguir não apenas do ângulo do tratamento, da terapêutica, mas sob o ponto de vista de que os indivíduos tenham seus direitos garantidos por terem uma doença. Esse é um debate sempre presente para quem está na área ocupacional: definir causalidade a partir do processo de trabalho. Isso muda a abordagem da seguridade social diante desse caso. Então, é fundamental estar discernindo isso”, concluiu.

Diagnóstico, tratamento e morbimortalidade

Falando sobre clínica, tratamento e diagnostico, o infectologista do Instituto de Pesquisas Clínicas Evandro Chagas (Ipec/Fiocruz) Bodo Wanke explicou que as micoses sistêmicas, assim como a paracoco, são grandes simuladoras, pois atuam aparentando uma infinidade de doenças. O tatu, explicou ele, é o animal que atua como hospedeiro da doença. O pesquisador relatou as classificações da paracoccidioidomicose, entre elas as dos tipos adulto e jovem, e listou algumas doenças associadas. Bodo Wanke abordou também questões relacionadas ao tratamento e à terapêutica da doença.

Para falar sobre a endemia no Rio de Janeiro e Brasil, o pesquisador da ENSP Ziadir Coutinho alertou: "O Brasil detêm 80% dos casos paracoccidioidomicose.” Segundo ele, a paracoco é uma doença latino-americana, pois só existe nesta região. “A saúde pública brasileira não está dando a devida atenção a esse grupo de doenças.” Em seguida, Ziadir expôs dados sobre distribuição da doença e morbidade. De acordo com o dermatologista, nos locais em que ocorre desmatamento é onde há a maior superexposição.

Por fim, Ziadir explicou que apenas o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamento para a paracoco, entidades particulares não oferecem. “A paracoccidioidomicose é responsável por 52% das mortes por micoses brasileiras. Atualmente, ela mata mais que malária e é a principal doença sistêmica no Brasil. Além disso, a subnotificação é reconhecida pelo Ministério da Saúde. Precisamos investir na integração da paracoco com o Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) e promover medidas socioeducativas”, ressaltou o pesquisador.

Ao término das palestras, houve a apresentação do documentário e um debate entre os pesquisadores e os profissionais do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria.