A complexidade em torno das epidemias de dengue, zika e chikungunya requer esforços do campo da ciência, além de ações do poder público, da sociedade civil e individuais a fim de aprimorar as ações de prevenção e combate. O governo brasileiro, por sua vez, trata como prioridade o investimento em novas tecnologias que contribuam para a investigação do vírus zika, mas até que ponto a eticidade dos projetos de pesquisa, especificamente em grávidas (um dos principais focos de preocupação), é discutida ou até mesmo considerada? É aceitável que se façam pesquisas sem os níveis primordiais de segurança? É a respeito desse tema que o Centro de Estudos Miguel Murat de Vasconcelos se debruçará na próxima segunda-feira (4/4), ocasião em que receberá o coordenador da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), Jorge Venâncio, e a pesquisadora da Universidade de Brasília Débora Diniz para o debate Zika: a ética em pesquisas e em questões de gênero. O Ceensp, coordenado pelo pesquisador da ENSP Sergio Rego, está marcado para as 14 horas, no auditório térreo da ENSP.
Na opinião do coordenador da atividade, o tema do Centro de Estudos destaca dois campos absolutamente cruciais nesse contexto de epidemia do zika vírus. O primeiro deles diz respeito às pesquisas em desenvolvimento. “Os estudos que precisam e vão ser feitos demandarão respostas e análises do nosso sistema de avaliação ética das pesquisas com humanos. Que pesquisas são entendidas como razoáveis para serem feitas? Onde deve ser a alocação prioritária de recursos em pesquisa? Como o sistema de avaliação ética se comportará frente a essa situação de emergência sanitária?”, questionou.
Para ilustrar a importância desse assunto, mencionou os estudos em mulheres grávidas. “Em geral, só fazemos pesquisas clínicas em grávidas depois de se confirmar a segurança dos produtos em não grávidas. Logo, é aceitável que se faça pesquisas em grávidas, um de nossos principais focos de preocupação nessa epidemia, antes de se ter segurança? Que participantes devem ter prioridade para o atendimento?”
Ainda no entendimento do pesquisador, as questões de gênero também são indispensáveis no atual contexto. “A microcefalia em fetos só é diagnosticada de forma tardia, e decisões sobre interrupção da gravidez devem ser tomadas precocemente. Em uma sociedade que mal cuida de seus indivíduos com deficiências, como se pode esperar uma atenção razoável aos futuros sujeitos com deficiências que estão nascendo no contexto da epidemia?” O coordenador na ENSP do Programa de Pós-Graduação em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva lembra o caso das mulheres que estão sendo abandonadas pelos pais das crianças com lesões justamente por não desejarem viver com as dificuldades adicionais decorrentes das anomalias. “É razoável que seja atribuída a responsabilidade e o ônus futuro às mulheres sem que tenham a oportunidade de decidir se querem ou não esse futuro? Que desafios a epidemia de zika traz para as políticas relacionadas com o gênero? O debate é fundamental. Participe também. Apresente seus argumentos e compareça”, convidou.
Ceensp
O Centro de Estudos Miguel Murat de Vasconcellos retomou suas atividades em 2016 debatendo o Estado da arte sobre a epidemia do Zika vírus: o que já sabemos e o que ainda precisamos saber, com participação do diretor da Fiocruz Mato Grosso do Sul, Rivaldo Venâncio da Cunha, da pesquisadora do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) Maria Elizabeth Lopes Moreira e da pesquisadora do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) Patricia Carvalho de Serqueira. Na opinião da vice-diretora de Pesquisa e Inovação da ENSP, Sheila Mendonça, abordar o tema novamente reforça a mobilização da Escola diante da complexidade da epidemia.
“A realização de mais uma atividade demonstra a priorização do tema da epidemia de zika na Escola, com envolvimento crescente dos pesquisadores em projetos epidemiológicos, de vigilância e determinantes sociais relacionados ao agravo das infecções associadas à doença. É importante destacar que todos os departamentos estão envolvidos em trabalhos de diferentes temas e formas. Essa mobilização deverá contribuir de forma efetiva para avançarmos no combate, prevenção de doenças e obtenção de melhores resultados”, pontuou.