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quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Pesquisa faz análise sobre barreiras tributárias a doações a Organizações da Sociedade Civil

Comparada a outros países, a cultura de doação do Brasil ainda é pouco desenvolvida. Contribui para piorar o quadro a complexa arquitetura tributária do Brasil, que não incentiva doações sistemáticas, principalmente para organizações da sociedade civil (OSCs). Preocupados em buscar estímulos para reverter este quadro, o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) e a Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP) lançaram, no dia 26 de agosto, o livro “Fortalecimento da Sociedade Civil: redução de barreiras tributárias às doações”.
Conforme se explica no prefácio, “a premissa que norteia as ações do projeto é a de que, nas últimas décadas, o protagonismo assumido pelas OSCs na garantia e afirmação de direitos não foi acompanhado por avanços correspondentes dos mecanismos de financiamento à disposição dessas entidades”.
O livro se divide em quatro capítulos, além da introdução e conclusão, sendo que o primeiro se dedica ao mapeamento dos estudos relacionados à tributação de doações para OSCs na experiência internacional e a sua comparação com a prática brasileira. Já o segundo se volta à seleção, sistematização, análise e comparação das normas estaduais sobre Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). O penúltimo capítulo se dedica a sistematizar a jurisprudência do STF e do STJ sobre a tributação de doações a OSCs. Por fim, o último capítulo buscou estudar a destinação dos recursos advindos da doação de ITCMD.
A obra reúne ainda uma seção de recomendações para aperfeiçoamento da legislação. As propostas já vêm sendo debatidas em encontros com especialistas e conta com o apoio de organizações articuladas na chamada "Frente ITCMD". Dentre as propostas, está a de pleitear isenção do ITCMD para doações às OSCs. Os Estados que se disponham a isentar OSCs de interesse público poderiam seguir o precedente do Rio de Janeiro, possivelmente incorporando aperfeiçoamentos para tornar a redação ainda mais clara e, com isso, criar um ambiente jurídico mais seguro para doadores e organizações, contribuindo para a mobilização de recursos privados para causas socialmente relevantes.
Principais conclusões do estudo:
Em uma pesquisa envolvendo 75 países com informações sobre tributação de heranças e doações, 30 realizam a tributação. As alíquotas costumam ser bastante onerosas: o percentual mínimo médio é de 6,9%, enquanto o máximo médio chega a 28,6%. Há países em que a alíquota podem ultrapassar os 50%, como Alemanha (50%), Japão (55%) e França (60%).
No Brasil, por sua vez, a alíquota média chega a 8%, sendo que alguns estados cobram 2%. No entanto, no universo dos 75 países analisados, o Brasil é um dos poucos que não estabelece um tratamento diferenciado de alíquota entre doações a OSCs, ao lado da Coreia do Sul e Croácia.
Colabora com este quadro a complexidade do tratamento legal. Como o ITCMD é um imposto de competência estadual, cada legislação tem suas regras próprias. Também não existe uma lei complementar que ofereça parâmetros mínimos a serem observados a nível nacional. As alíquotas podem flutuar entre 2% e 8%.
A estrutura complexa para cobrar o ITCMD não corresponde ao valor arrecadado. Considerando tanto heranças quanto doações, a receita líquida de arrecadação com ITCMD corresponde a menos de 1% da receita corrente líquida.
Estado de São Paulo é o maior arrecadador de ITCMD do país. Em 2016, arrecadou R$ 2,3 bilhões do total nacional (R$ 7,3 bilhões). Segregando pelo fato gerador do imposto, R$ 1,1 bilhão originou-se de herança e R$ 1,2 bilhão de doações.
Do total de ITCMD obtido com doações no Estado de São Paulo, apenas R$ 23,6 milhões (ou 1% do total de arrecadação com ITCMD ou 0,0168% da receita corrente líquida) referem-se a doações a pessoas jurídicas. Os dados não diferenciam doações para pessoas jurídicas com ou sem fins lucrativos. Possivelmente o total arrecadado de doações para OSC seja ainda menor.
A recepção dos dados analisados pelos especialistas foi positiva. Segundo Carlos Augusto Gomes Neto, da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, as informações levantadas irão dar base ao trabalho que está sendo promovido na Secretaria da Fazenda para desburocratizar o ITCMD, tornando o processo mais ágil e célere por meio do uso de big data. O representante do Governo também afirmou que estão sendo avaliadas alterações em portarias, decretos, e até mesmo na legislação, e propôs o diálogo com o grupo do projeto Sustenta OSC a partir dos dados levantados.