“Ciência e Ação Política: Por uma Abordagem Crítica”
O período atual está marcado pela presença de cidades em profundo processo de modificação e expansão territorial pela implantação de empreendimentos de grande porte, dos mais variados ramos: petrolífero, siderúrgico, rodoviário, ferroviário, imobiliário, naval, comercial, portuário, esportivo, serviços etc. Ocorrem na escala brasileira e mundial acelerada valorização e ampliação dos lançamentos dos produtos imobiliários, que compreende variados estratos de consumo, desde os novos loteamentos e condomínios de alto padrão das áreas de expansão urbana até unidades populares oriundas de política públicas habitacionais. A reestruturação urbana termina por engendrar a configuração de novas paisagens, territorialidades e espacialidades nas cidades. Surge como paradigma a necessidade da alteração dos sistemas de transportes, com implantação de corredores viários e vias rápidas de interligação, soluções de mobilidade urbana por metrôs e veículos leves sobre trilhos, processos de descentralização e novas nucleações, novos padrões de valorização da terra urbana, dinâmicas crescentes de gentrificação e de segregação espacial. Cidades se preparando para megaeventos esportivos, seja como sede, cidade-satélite ou cidade-turística. Problemas socioambientais no urbano, como destinação de resíduos, a contaminação atmosférica e os transbordamentos, deslizamentos e enchentes em bairros e vias públicas, que implicam em constantes tensões e conflitos desta natureza. Militarização da questão urbana, que condena particularmente as áreas periféricas a programas de aguda remoção habitacional, marginalização e convívio de seus habitantes com formas aparentes de repressão e violência. “Antigas” e “novas” lutas se articulam nos espaços urbanos, em um conjunto de reivindicações tratadas no movimento da Reforma Urbana, em prol do direito à moradia, do questionamento às mazelas ambientais, da regularização fundiária, da erradicação dos vazios urbanos etc. Tais mutações remetem à atual dinâmica urbana, resultante, condicionante e meio da nova fase da acumulação capitalista das últimas décadas.
É ponto pacífico o fato de que, guardadas as devidas peculiaridades, a realidade anteriormente descrita poderia relacionar-se às mais diferentes cidades brasileiras (e mesmo mundiais). Há no Brasil atual uma miríade de dinâmicas, rupturas e transformações urbanas promovidas por questões econômicas, políticas e sociais. As contradições apresentadas são inerentes ao capitalismo em sua fase hodierna e revelam as adaptações das condições gerais de produção, necessárias nesse novo contexto de reprodução dos capitais, o que desnuda a necessidade premente de se refletir coletivamente sobre a condição urbana na geografia contemporânea. Emerge assim um objetivo ambicioso para o pesquisador que possui a cidade como objeto de análise: ampliar o debate acerca das contradições do espaço urbano no Brasil contemporâneo, com base na “teoria crítica” que permite uma profícua reflexão da dos fundamentos da “crise urbana”, enquanto uma face, uma vertente ou mesmo uma expressão da crise atual do capitalismo.
A proposta para o XIII Simpósio Nacional de Geografia Urbana – SIMPURB [Rio de Janeiro, 2013], a ser realizado nas instalações da UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, campus Maracanã, entre os dias 18 e 22 de novembro, é pensar a questão urbana em sua complexidade, conciliando “teoria e empiria”, “reflexão e prática”, “planejamento e crítica”. A metrópole do Rio de Janeiro receberá professores, pesquisadores e estudiosos envolvidos com a questão urbana, convocados para a efetivação de um duplo, porém conciliável, esforço teórico: [1] pensar o fenômeno urbano, em sua multiplicidade concreto-imaterial, que envolve as questões políticas, econômicas, sociais, culturais e ambientais, de maneiras entrecruzadas, complementares e conflituosas; e [2] refletir sobre os avanços e práticas da Geografia Urbana, entendendo que este campo do conhecimento pode contribuir decisivamente em questões de reflexão, planejamento, pesquisa e intervenção, bem como nas práticas socialmente constituídas.
Tradicional evento bianual, o Simpósio Nacional de Geografia Urbana (SIMPURB), desde sua primeira edição (USP, São Paulo, 1989), objetiva consolidar a reflexão – científica, prática, militante, de maneira interdependente e articulada – sobre o fenômeno urbano em sua condição polissêmica. O urbano é concreto-abstrato, objeto-ação, consenso-dissenso, planejamento-luta, ciência e ação política. Neste SIMPURB 2013, ambiciona-se contribuir para que este evento permaneça enquanto ágora dos mais profundos debates sobre o fenômeno urbano, cumprindo seu papel histórico crucial de se pensar a Geografia Urbana enquanto campo de conhecimento militante, que recupera as demandas de diferentes grupos sociais. Em tempos de urbanização em moto-contínuo, o SIMPURB busca o diálogo entre a Geografia (com todas as suas inquietações) com outros campos de análise científica (História, Economia, Sociologia, Ciência Política, Arquitetura, Planejamento e Engenharia Urbana, entre tantos outros) e na esfera social, através de movimentos e coletivos sociais, ativismos urbanos, grupos de resistência, associações de moradores, etc. Atávica à luta, à transformação, à ação militante e à criatividade, a crítica do urbano permite a conjugação entre as mais diversas perspectivas e análises dos mais diferentes sujeitos político-sociais.
“Ciência e Ação Política: Por uma Abordagem Crítica” é um convite à práxis, este esforço coletivo de se fazer do pensar um ato de rebeldia! Conforme ensinamentos de David Harvey[1], a proposta é alimentar o desenvolvimento de alternativas e possibilidades de ação humana que priorizem a vontade de criar, unindo os diferentes saberes entre si de maneira dinâmica e evolutiva, e que abarque diversas escalas espaço-temporais.
A “ciência” aqui aludida obedece aos rigores teórico-metodológicos exigidos em um evento desta magnitude. Em 1999, o Brasil tinha vinte e um programas de pós-graduação na área de Geografia; em 2012 são cinquenta e um, aumentando cerca de 140% o número de programas e multiplicando indefinidamente o número de pesquisadores da temática urbana. Neste panorama, o número de participantes no SIMPURB aumentou de maneira progressiva, e, destacadamente, as temáticas também se expandiram, consolidando debates importantes como o turismo, problemática ambiental na cidade e a dimensão subjetiva do urbano. O propósito do SIMPURB 2013 [UERJ, Rio de Janeiro] é convocar os principais pesquisadores da temática urbana brasileira a construir horizontes analíticos cientificamente rigorosos e criativos.
Há uma demanda pela consolidação de aportes teóricos, conceituais e metodológicos da Geografia Urbana do tempo presente. Os jovens pesquisadores oriundos da expansão da pós-graduação da última década anseiam por debates que vislumbrem o esforço de construção de novos caminhos analítico-conceituais. A inclusão destes estudiosos espraiados pelo território brasileiro, para além de uma exigência “geográfico-cartográfica” de abarcar as diferentes regiões do país, deve significar uma plena inserção intelectual dos múltiplos olhares, estudos e realidades nos debates realizados.
Isto envolve uma convocação para produzir a Geografia Urbana enquanto “ação política”. É seguramente indiscutível que ciência e política são indissociáveis, e que o saber científico se encontra em uma bifurcação: ou segue o caminho de atender as demandas do status quo ou escolhe a trilha que possibilite apresentar alternativas de transformação da realidade presente. A “ação política” aqui proposta representa um manifesto: a produção do conhecimento científico não deve ficar restrita ao ocaso das prateleiras e cátedras universitárias; não obstante, os resultados das investigações do pesquisador deste campo de análise não devem promover um saber inaudível e ininteligível à sociedade. Afinal, assistimos o fausto da multiplicidade dos conhecimentos em concomitância com o entrecruzar das vozes dos movimentos sociais em sua diversidade teórico-empírica, tornando imperativo que os geógrafos extravasem os limites dos muros da universidade.
A cidade atual resplandece como uma contínua e contraditória prática de produção do espaço. “A industrialização caracteriza a sociedade moderna”[2], e sua efetivação alterou profundamente a geografia do mundo, artificializando o espaço geográfico com próteses territoriais no advento do meio técnico[3]. Neste quadro, a acumulação de problemas sociais nas zonas rapidamente produzidas pela industrialização levou a conceber a cidade como portadora de “deficiências patológicas”[4]. O capitalismo, seja em sua face industrial, financeira ou ideológico-cognitiva, impôs ao urbano um definitivo elo com o universo que nos cerca, efetivando um modelo de sociedade marcada por simulações da realidade em que vive.
É mister que o geógrafo estude a história da cidade, como deixou registrado em sua obra o Professor Mauricio de Almeida Abreu, assim como é emergencial que a Geografia Urbana proponha ações de cunho prático-transformador. Em um momento de aceleração espaço-tempo[5], a construção de uma abordagem crítica deve se configurar como ciência e como ação política.
Como sabemos, esta abordagem crítica é multifocal. Há que se manter uma abordagem crítica da cidade, do fenômeno urbano, da urbanização brasileira, assim como da própria Geografia Urbana que se pratica, do fazer científico sem compromisso social, da ação política do geógrafo no Século XXI. Mas também é possível ambicionar uma abordagem crítica da própria crítica! Existem questões que permanecem contemporâneas e sob nenhuma hipótese devem ser alocadas em um relicário científico: como fazer da crítica um verdadeiro instrumento de luta social? Como aproximar o saber científico das exigências de uma cidade em crise? Quais tessituras teóricas permitem de fato explicar o urbano na contemporaneidade? Trata-se de uma missão para todos os presentes no XIII SIMPURB – Simpósio Nacional de Geografia Urbana, Rio de Janeiro, 2013.
O convite está feito. E que todos os presentes atendam à renovação do compromisso de uma abordagem crítica e socialmente referenciada, devidamente articulada com a sociedade civil.
Dia 18 de novembro: 10:00 às 12:00 horas
Conferência de Abertura: Professora Dr.ª Arlete Moysés Rodrigues (Unicamp);
14:00 às 17:00 horas: Auditório 11
Mesa 1. A produção do urbano: abordagens e métodos de análise
Palestrantes: Márcio Piñon (UFF), Odette Seabra (USP) e Sérgio Martins (UFMG)
Debatedor: Pablo Ciccolella (UBA)
18:00 às 21:30 horas: Auditório 11
Mesa 2: Urbanização/metropolização: tendências contemporâneas
Palestrantes: Álvaro Ferreira (PUC-Rio), Maria Encarnação Sposito (UNESP) e William Ribeiro (UFRJ),
Debatedor: Sandra Lencioni (USP)
Dia 19 de novembro
9:00 as 12:00 horas: Auditório 11
Mesa 3. Conflitos, meio ambiente e resistências no espaço urbano
Palestrantes: Ana Paula Fracalanza (USP), Angelo Serpa (UFBA), Désirée Guichard (UERJ) e Henri Acselrad – IPPUR
Debatedor: Leandro Dias de Oliveira (UFRRJ)
18:00 às 21:30 horas: Auditório 11
Mesa 4: Economia urbana, desigualdade sócio-espacial e políticas urbanas
Palestrantes: Amélia Damiani (USP), Jan Bitoun (UFPE), Silvana Pintaudi (UNESP), Susana Pacheco (UERJ) e Maria Laura Silveira (UBA)
Debatedor: Jorge Barbosa (UFF)
18:00 às 21:30 h: Auditório 13
Mesa 5: Mobilidade urbano-regional, migrações e dinâmica rural-urbana
Coordenação: Lirian Melchior [UFRRJ], Denise Elias [UECE], Maria Luisa Castelo Branco [IPGH] e João Rua [PUC-Rio]
Debatedor: Heinz Dieter Heidemann (USP)
Dia 21 de novembro
9:00 as 12:00 horas: Auditório 11
Mesa 6: Megaprojetos e produção do espaço urbano
Palestrantes: Eustógio Dantas (UFC), Marcio Valença [UFRN], Nelba Azevedo Penna (UNB), Paulo Cesar Xavier (USP)
Debatedor: Gilmar Mascarenhas (UERJ),
18:00 às 21:30 horas: Auditório 11
Mesa 7 – Geografia Histórica e Práticas culturais na produção da cidade
Palestrantes: Anita Loureiro (UFRRJ), Aureanice Corrêa (UERJ), Doralice Sátyro Maia (UFPB) e Nécio Turra (UNESP).
Debatedor: Pedro de Almeida Vasconcelos (UFBA)
Dia 22 de novembro: Teatro Odylo Costa Filho
9:00 as 10:30 horas: Solenidade de homenagem aos professores eméritos:
Prof. Dr. Pedro Pinchas Geiger (UERJ) e Prof. Dr. Roberto Lobato Corrêa (UFRJ)
Coordenação Prof. Dr. José Borzacchiello da Silva.
10:00 às 12:00: Conferência de encerramento Professor Dr. David Harvey (City University of New York)
18:00 às 21:00 horas: Auditório 11
Mesa 8: Geotecnologias , informação e comunicação aplicadas ao urbano
Palestrantes: Hindenburgo Pires (UERJ), André Lemos (UFBA), Lindon Fonseca Matias (UNICAMP) e Luis Cavalcanti da Cunha Bahiana (IBGE)
Debatedor: Tamara Egler (IPPUR/UFRJ)
18:00 às 21:00 horas: Auditório 13
Mesa 9: Geografia no diálogo com os espaços de resistências na cidade
Palestrantes: Regina Bega dos Santos (Unicamp), Renato Pequeno (UFCE), Inalva Mendes Brito (Associação de Moradores da Vila Autódromo),Mariana Mendes (UNICAMP), Renato Cosentino (Comitê Popular Rio Copa e Olimpíadas).
Debatedor: Nelson Rego (UFRGS).
21:00 horas: assembleia de encerram