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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Especialistas debatem relação entre saúde e desenvolvimento territorial

O Seminário Internacional Determinantes Sociais da Saúde Intersetorialidade e Equidade Social na América Latina reuniu pesquisadores, professores e representantes da sociedade civil para uma discussão sobre Estado, sociedade e saúde no desenvolvimento territorial. A mesa, moderada pela coordenadora de mestrados profissionais da Capes, Eduarda Cesse, contou também com a participação do diretor da ENSP, Hermano Castro, do pesquisador da Fiocruz Bahia Maurício Barreto, do professor da Universidade de Contestado Valdir Dallabrida, das pesquisadoras do Ifakara Health Institute, da Tanzânia, Eveline Geubbel e Masuma Mandami, e do representante do Observatório de Territórios Saudáveis e Sustentáveis da Bocaina, Wagner do Nascimento. O encontro debateu questões como a omissão dos determinantes sociais da saúde nas políticas de saúde, o conceito de território, as invasões e danos no contexto territorial, além de apresentar experiências exitosas no âmbito da saúde internacional.

Para discutir a contribuição da geografia política para a abordagem territorial das políticas públicas, o professor da Universidade de Contestado - Santa Catarina, Valdir Dallabrida, admitiu que o conceito de território possui diferentes noções e concepções. “O território não é outro senão um espaço relacional que se constrói no tempo. Ele pode ser entendido como aquela porção do espaço geográfico na qual uma determinada comunidade se reconhece e se relaciona no seu agir individual ou coletivo, cuja especificidade descende do processo de interação entre esta comunidade e o ambiente. Território pode ser conhecido a partir da imbricação de múltiplas relações de poder: do poder mais material das relações econômico-políticas, ao poder mais simbólico, das relações de ordem mais estritamente cultural. Portanto, não se criam territórios – por decretos –, se reconhecem territórios historicamente construídos por grupos sociais, em processos relacionais.”, explicou o professor.

Dallabrida questionou que se o território é lugar de vivência em que se expressam múltiplas relações de poder, como podemos pensar o planejamento e a gestão do território? Segundo ele, o planejamento essas duas questões devem ser entendidas como um processo de concertação social e tomada de decisão, que envolve atores sociais, econômicos e agentes governamentais de um determinado recorte territorial, visando à definição de seu futuro. "Isso se chama governança territorial. Trata-se de um processo conflituoso, pois o grande desafio é mediar interesses e visões diferenciadas", disse.

"A governança territorial tem diversos propósitos: orientar e promover o desenvolvimento de recursos territoriais, estabelecer voluntariamente relações horizontais de cooperação e parceria territorialmente, entre outros. Mas o que ela pretende, de fato, é contribuir para a coesão territorial e o desenvolvimento sustentável e equilibrado do território. Pensar, discutir e decidir políticas públicas, na perspectiva da governança territorial, exigem espaços de concertação público-privada, uma esfera pública democrática e sem coerção, pois processos deste tipo têm o sentido de exercitar a cidadania”, defendeu ele.

Pesquisador do Centro de Pesquisa Gonçalo Muniz (Fiocruz Bahia) Maurício Barreto fez um reflexão sobre a omissão de determinantes sociais da saúde nas políticas de saúde. Começando sua reflexão, citou a redução de 20% da mortalidade infantil no Brasil por conta da ampliação da cobertura da Atenção Básica, o acesso à vacinação e o crescimento das taxas de aleitamento materno. O pesquisador destacou que poucos países colocam a saúde em sua Constituição e o Brasil está nesse caminho. A lei 8080, em seu artigo 3º, define que saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais. “Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica do país”, alertou.

Maurício Barreto apresentou algumas razões para a possível pouca relevância dos DSS nas políticas de saúde, que englobam o peso das explicações biomédicas na área e a despolitização dos determinantes, entre outros fatores. Segundo o professor, nos últimos anos há uma forte ênfase nas abordagens biomédicas para tratar dos desafios da saúde global. O modelo biomédico é orientado para o indivíduo na doença e na saúde. A abordagem é largamente curativa para reparar o corpo e mal inclui medidas preventivas como os programas de imunização em massa. “Os estudos dos DSS, apesar de sua importância, têm se caracterizado por um conjunto de premissas empíricas que identificam as circunstâncias socioeconômicas como as causas-finais ou causas das causas dos desfechos em saúde e das desigualdades em saúde. Além disso, existe um conjunto de pressupostos normativos de que desigualdades sociais em saúde são injustas e, portanto, devem ser retificadas por uma questão de justiça social”, concluiu.

Os custos do progresso

O diretor da Escola Nacional de Saúde Pública, Hermano Castro, abordou em sua fala os danos no contexto territorial, causados principalmente pelos grandes empreendimentos. Segundo ele, o crescimento populacional humano, a globalização e o livre comércio intercontinental são alguns dos fenômenos que fortalecem os mecanismos de introdução de modelos desenvolvimentista com grandes ameaças locais, regionais e globais. Hermano citou, por exemplo, a evolução da dengue nas Américas. Enquanto no século XX apenas cinco países apresentavam casos da doença, atualmente, no século XXI, aproximadamente trinta países contam com este problema  Outro exemplo apresentado foram as emissões de carbono brasileiras provenientes 30% da queima de combustíveis fósseis e 70% pela mudança de uso do solo.



Hermano questionou que tipo de desenvolvimento queremos. “O modelo agrícola que temos hoje é o do agronegócio. No oligopólio da soja temos cinco empresas que dominam o mercado mundial. O custo de produção inicial da soja, por exemplo era de 13 dólares a saca. Com a produção aumentando ano a ano, o preço deveria cair, mas atualmente custa 33 dólares. Ainda sim, persiste o modelo de produção agrícola baseado no agronegócio, dependente do uso de agrotóxicos, com seus impactos extremamente danosos à saúde e ao meio ambiente, levando à contaminação do ar, da água e do solo. O Brasil gera, anualmente, cerca de 100 mil intoxicações agudas e crônicas e 400 óbitos por agrotóxicos. A agroecologia deve ser estimulada para substituir o modo agrícola atual”, explicou.

Hermanos citou também os impactos das mudanças climáticas nas doenças transmitidas por vetores. Dengue, malária, febre amarela, oncercose, esquistossomose e filariose linfáticas são alguns dos exemplos de doenças que terão prováveis alterações na distribuição geográfica em virtude das mudanças climáticas. O diretor da ENSP encerrou sua apresentação falando sobre os custos socioambientais para o progresso trazido pelos grandes empreendimentos, das leis de banimento do amianto em vários estados brasileiros com o fechamento de empresas, e o mais recente caso de crime ambiental da cidade de Mariana. “A lama que vazou de barragens pode provocar problemas ósseos, intestinais e agravar distúrbios cardíacos", afirmou.

Preservar é resistir!

Iniciando sua fala, o representante do Observatório de Territórios Saudáveis e Sustentáveis da Bocaina Wagner do Nascimento, apresentou ao público o documentário Preservar é Resistir. Wagner falou sobre o Fórum de Comunidades Tradicionais e a localização das comunidades, além de ressaltar que os locais que possuem mata conservada no Brasil são aqueles que contam com Comunidades Tradicionais. Segundo ele, a especulação imobiliária é um dos fatores que mais aumenta a pressão nestas comunidades. O representante citou também algumas ações que são desenvolvidas no território por meio de Arranjos Produtivos Locais, com fundos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) e da Fiocruz. Entre elas estão o Turismo de Base Ecológica e a Agroecologia.

Encerrando a mesa sobre Estado, sociedade e saúde no desenvolvimento, as pesquisadoras do Ifakara Health Institute, da Tanzânia, Eveline Geubbel e Masuma Mandami apresentaram o contexto do país, localizado na África Oriental. Cem tribos vivem no local, sendo três quartos delas nas áreas rurais. Segundo as pesquisadoras, o país é extremamente marcado pelas desigualdades sociais, mas vem passando por uma agenda de equidade. Com a implantação de um Plano Estratégico de Saúde foi a primeira vez que os DSS foram contemplados no país. Eveline e Masuma falaram também sobre as pesquisas desenvolvidas no Ifakara.

Um dos trabalhos selecionou 23 distritos para investigar a situação de saúde dos locais. “Uma pesquisa que desenvolvemos identificou que em uma determinada região, crianças e adultos morriam frequentemente de malária. Fizemos uma grande analise e tentamos mudar essa situação. A consequência foi uma enorme diminuição da mortalidade infantil no país, pois milhares morriam de malária na Tanzânia”, ressaltaram as pesquisadoras. Sobre o sistema de saúde do país, ambas afirmaram que ele funciona completamente diferente do sistema de saúde brasileiro, com financiamento por impostos, por recursos próprios e de seguros de saúde. Por fim, Eveline e Masuma falaram sobre o progresso da equidade na Tanzânia e apontaram diretrizes para o futuro, destacando que “a pesquisa não tem valor se não influencia as políticas”.