O coronelismo é a manifestação do poder privado – dos senhores de terra – que coexiste com um regime político de extensa base representativa. Refere-se basicamente a estrutura agrária que fornecia as bases de sustentação do poder privado no interior do Brasil, um país essencialmente agrícola.
Definido como um compromisso, uma troca de proveitos entre o Poder Publico, progressivamente fortalecido, e a decadente influencia social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras. A força dos coronéis provinha dos serviços que prestavam ao chefe do Executivo, para preparar seu sucessor nas eleições, e aos membros do Legislativo, fornecendo-lhes votos e assim ensejando sua permanecia em novos pleitos, o que tornava fictícia a representação popular, em virtude do voto "manipulado".
Certas atribuições, tais como eleger o governador e o prefeito, criar certos impostos, foram retiradas do poder central e transferidas para os estados e municípios. Essa descentralização, introduzida pela República, fortaleceu o poder local.
Os grandes fazendeiros interferiam violentamente nas eleições.
Esses grandes fazendeiros eram chamados de coronéis e seu sistema de dominação, o coronelismo, cujo papel principal cabia aos coronéis.
Os coronéis acabaram assumindo um grande poder. O coronel era, sobretudo uma figura local, exercendo influencia nas cidades menores, mais afastadas e sua imediações.
Nessas localidades, aonde não chegava a influencia do Estado, certas funções publicas, tais como policia, justiça e outras passaram a ser exercida de forma privada, pelos coronéis. Mesmo que no município existissem os delegados, o juiz, prefeito, essas autoridades, encontravam-se submetidas ao seu poder.
O coronel tinha de mandar e ser obedecido, era a pratica do "mandonismo local".
Esse poder decorria de sua condição de grande proprietário, e era proporcional à quantidade de terras que possuía. Quanto mais terra, maior era o numero de pessoas que dependia do coronel.
Estabeleceu-se uma relação de dominação pessoal do "coronel" sobre seus dependentes. Quando se perguntava a alguém: "Quem é você?", a reposta era: "Sou gente do coronel fulano". Essas pessoas constituíam a clientela do "coronel".
Havia milhares de coronéis espalhados pelos municípios brasileiros. Nem todos os coronéis tinham o mesmo poder de influencia, nem todos eram amigos entre si.
Na disputa pelo poder era comum explodir lutas sangrentas entre bandos de jagunços de coronéis adversários. Ao final, o coronel mais poderoso e violento acabava por se impor na região em disputa.
O coronel mais importante estabelecia alianças com outros fazendeiros para eleger o governador do estado.
Os coronéis alem de manipular os votos através do voto de cabresto, utilizavam muitas fraudes para ganhar as eleições. Exemplos: documentos eram falsificados para que menores analfabetos pudessem votar; pessoas que já tinham morrido eram escritas como eleitores; urnas eram violadas e votos adulterados; muitas artimanhas eram feitas na contagem de votos.
A força do coronelismo era maior nas regiões mais atrasadas, porque nesses lugares a população não encontrava ou encontrava poucas possibilidades de viver fora da agricultura. Nas regiões mais urbanizadas a população ganhava mais independência política que podia encontrar empregos no comercio e na industria.
São resultantes desse compromisso algumas características do sistema Coronelista que ainda perduram em nosso país: o mandonismo, o filhotismo, o nepotismo, o falseamento do voto e a desorganização dos serviços locais.
Nas ultimas décadas do século, a população rural correu para as cidades, atraída inicialmente pelo processo de industrialização e deixou de usar a enxada como instrumento de trabalho, a relação entre o coronel e o voto de cabresto parece sobreviver sob novas formas diversificadas de "coronelismo" no Brasil urbano.
A relação de reciprocidade ganha novos contornos e amplia a sua esfera para outras arenas: a vaga na escola só é concedida pelo vereador – a rede de água e esgoto ou a instalação elétrica compete ao deputado estadual; e os investimentos em transporte ou pólos de desenvolvimento ficam com os deputados federais e os senadores.
As políticas públicas acabam sempre privatizadas pelas verbas distribuídas diretamente aos parlamentares, pela contratação de cabos eleitorais para assumir funções nobres em órgãos públicos ou pelos "currais comunitários" desenvolvidos pelos "coronéis modernos".
Este procedimento de utilização direta ou indireta dos recursos públicos mantém, alimenta e conserva a "relação de reciprocidade" e acaba por atender mais a sustentação das lideranças dos coronéis modernos em detrimento da implantação, organização e democratização de políticas públicas voltadas para o cidadão e para a sociedade.
A atualidade do coronelismo, tratando por exemplo, do Ceará, é a seguinte: Voto de curral, principalmente no interior, política de aliados pela troca de favores e distribuição de cargos federais, estaduais e municipais para apadrinhados dos poderosos ainda encontram eco na cultura local. Hoje a precária estrutura partidária do interior continua ao sucumbir diante de pressões. Votos são trocados por cestas, tijolos e até dentaduras.
E o que dizer do coronelismo eletrônico? O advento das mídias eletrônicas de massa e sua universalização, num país onde os baixíssimos níveis de educação da população as transformam num meio hegemônico de informação e, mais grave que isso, num meio hegemônico de formação e de indução de modas e costumes, ensejam o surgimento de uma versão eletrônica do fenômeno do coronelismo, infinitamente mais abrangente e perigoso que a versão anterior.
Quem, não por acaso, deu o impulso definitivo a esse surgimento foi um dos mais legítimos representantes dessa versão brasileira do caudilhismo, o ex-senador Antonio Carlos Magalhães que, quando ministro das Comunicações do governo José Sarney, distribuiu canais de radio e televisão a todos os grupos políticos regionais dominantes, especialmente no Norte e Nordeste do País, e articulou a filiação de muitos desses canais à mais poderosa das redes privadas de televisão, à qual ele estava, na época, umbilicalmente ligado. Assim nasceu a relação de crescente promiscuidade entre o poder político e o poder da mídia que desvirtua a democracia brasileira.
Em reportagem publicada pela Folha de S. Paulo, em 15/08/2001, temos um retrato atualizado desse quadro:
Os políticos controlam ¼ das emissoras comerciais de televisão do Brasil: 60 de um total de 250. Esse número se refere apenas aos veículos que detêm concessão governamental para reger programação. A Rede Globo tem 21 filiais pertencente a políticos, o SBT tem 17, a Bandeirantes 9. entre os políticos que vivem de retransmitir e vender programação da Globo em seus estados estão os ex-presidentes Jose Sarney e Fernando Collor de Mello, os governadores Roseana Sarney (MA), Garibaldi Alves Filho (RN) e Albano Franco (SE), o ex-senador e ex-governados da Bahia Antonio Carlos Magalhães e o atual senador Antonio Carlos Magalhães Junior (BA), e mais um ex-senador, oito deputados federais e um estadual. Entre os que vivem do SBT, estão o governador Tarso Jereissati (CE), o presidente interino do Senado, Edison Lobão (MA), três ex-governadores (Quércia, Paulo Pimentel e Nilo Coelho) e mais quatro deputados federais. Ligados a Bandeirantes, há três senadores – entre eles o licenciado Jader Barbalho (PA). E há ainda as redes menores, todas com sua coleção de políticos.
Uma vez estabelecida à ligação entre essas duas pontas, ela ganha uma dinâmica própria virtualmente impossível de deter.
Freqüentemente, na Bahia, esta ligação foi tão escandalosa que mereceu um capitulo especial no relatório anual da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) -, os donos dessas redes, quando no poder, carreiam toda a publicidade oficial para seus próprios veículos, o que lhes permite esmagar a concorrência e calar as vozes da oposição. Acabam se elegendo e se reelegendo graças ao domínio total da mídia que exercem em seus territórios. Metade do que é auferido vai a rede a qual estão associados que, desse modo, pode reproduzir seu esquema de expansão e domínio de mercado – e, conseqüentemente, de poder político – em âmbito nacional.