O Brasil não tem renda capaz de sustentar seu atual mercado de planos de saúde, que tem mais de 50 milhões de clientes, disse a pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ligia Bahia, durante o programa Observatório da Imprensa, exibido em 22/10 pela TV Brasil. Segundo ela, em razão disso empresas de planos de saúde estão indo à falência enquanto os consumidores arcam com preços cada vez maiores ter acesso aos planos.
“Somos o segundo maior mercado de plano de saúde do mundo, mas não temos o segundo maior PIB [Produto Interno Bruto] do mundo. A gente tem percebido um movimento que são quase individuais, de associações e de sindicatos, de tentar sobreviver fora do SUS [Sistema Único de Saúde]. Isso não tem dado certo. As empresas vão à falência, não vendem planos individuais, os preços ficam cada vez mais salgados. Os preços ficam impossíveis de ser pagos pelos orçamentos das famílias e pelas empresas empregadoras. E aí a gente há um dilema: para onde vamos? Vamos para o SUS ou vamos para um sistema privado que é do 'salve-se quem puder'?”, disse.
De acordo com o Pedro Ramos, diretor da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), que representa as operadoras de planos de saúde, o setor está passando por uma crise financeira em razão de exigências da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e por causa de má fé de alguns prestadores de serviços públicos, que cobram dos planos por serviços desnecessários.
“Num país que não tem água nem esgoto, não é possível, num rol de procedimentos, a agência querer trazer tecnologias do primeiro mundo. Além disso, há desperdício em corrupção, em má gestão, na máfia de órtese e prótese e o governo fecha os ouvidos. Temos que discutir um novo modelo de remuneração [aos prestadores de serviços médicos]. Aquele cara que tratar melhor meu paciente, que tirar meu paciente mais rápido do hospital e der uma melhor qualidade de vida para o meu paciente, eu vou pagar mais”, disse Ramos.
Para o advogado João Tancredo, que representa pacientes que não conseguem atendimento satisfatório dos planos de saúde, saúde não pode ser tratada como negócio, porque, nesse caso, quem perde é o paciente.
“O interesse do plano de saúde é que o idoso morra. O plano não tem interesse em receber aquela mensalidade, porque gasta-se mais [com o paciente do que se recebe dele]. É tudo um negócio. Enquanto a gente tiver tratando de saúde como um negócio, a gente não vai chegar num bom lugar, a gente não vai ter um país decente, com princípios de igualdade. A gente tem que melhorar a saúde como um todo, especialmente para aquele que não pode pagar. Esse é que morre, diuturnamente, nas filas”, disse João Tancredo.
Tanto João Tancredo quanto Ligia Bahia acreditam que a solução para a crise no sistema de saúde privado do Brasil é investir mais no SUS.
“Na verdade, o sistema privado não é melhor do que o público. Por que as pessoas querem ter plano de saúde? Porque se promete que o plano de saúde terá alta tecnologia, que o plano de saúde vai pegar de helicóptero e que o SUS é ruim. Isso tem sido reiterado ao longo do tempo, quando na verdade não é bem assim. No mundo inteiro, os melhores sistemas de saúde são os públicos não são os privados”, disse Ligia.
Segundo Lígia, os planos de saúde priorizam pessoas jovens e saudáveis. “Quem é doente e idoso vai ficando para trás. Esse é o problema desse processo que está ocorrendo, que é dramático e não precisaria ocorrer se tivéssemos o sistema público de saúde aprovado pela Constituição de 88. O debate é o SUS, mais do que nunca. Temos que impedir que a tesoura do ajuste fiscal venha em cima do SUS. Essa é a nossa luta nesse momento”.