Setenta por cento dos alimentos no Brasil apresentam resíduos de agrotóxicos". A afirmação foi exposta pelo pesquisador do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh/ENSP), Luiz Cláudio Meirelles, durante a última sessão do 'Encontros do Cesteh', que teve como tema O monitoramento de resíduos de agrotóxico em alimentos no Brasil. Na ocasião, Meirelles alertou para o fato de que o Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, chegando a consumir cerca de um milhão de toneladas por ano, o que causa impactos negativos à saúde humana e ao meio ambiente. Segundo o pesquisador, a exposição aos resíduos de agrotóxicos nos alimentos constitui umas das principais fontes de contaminação da população.
No Brasil, de acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), até março de 2016, foram autorizados 511 ingredientes ativos para uso agrícola, não agrícola, domissanitário, ambientes aquáticos e preservantes de madeira. Desses, 303 ingredientes ativos são para aplicação em frutas e hortaliças; 1.079 são produtos comerciais vendidos no mercado nacional; e 60 agrotóxicos estão proibidos na Austrália, Canadá, Estados Unidos e Europa. Segundo o pesquisador, dos 50 agrotóxicos mais usados no país, pelo menos 29 estão proibidos em outros países. “É preciso pensar no controle da cadeia produtiva para controlar o uso de agrotóxicos”, destacou ele.
O pesquisador citou, por exemplo, que o glifosato – indicado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) como altamente cancerígeno – é o agrotóxico mais usado no Brasil. Dando prosseguimento à apresentação, Luiz Cláudio falou sobre a participação do Cesteh/ENSP no Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para). O Programa de Análise integra medidas de controle pós-registro, que têm promovido mudanças na organização dos serviços de saúde para prevenção de agravos relacionados aos agrotóxicos. Segundo o pesquisador, suas atividades principais são a promoção da saúde por meio do consumo de alimentos de qualidade; e a prevenção das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) secundárias à ingestão cotidiana de quantidades perigosas de agrotóxicos.
Meirelles destacou também que, atualmente, o objetivo do Para é verificar se os limites de uso dos agrotóxicos estão sendo respeitados. O Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos foi criado em 2011 e já monitorou 237 ingredientes ativos e 25 culturas. De 2013 a 2015, foram pesquisados os níveis de agrotóxicos em alimentos. Na lista apresentada por Meirelles, alimentos como banana, cebola e beterraba, possuem mais de 150 agrotóxicos. O pesquisador pontuou também algumas considerações sobre o Relatório do Para de 2016.
Segundo ele, o uso da linguagem banalizou o risco e reduziu a importância das irregularidade encontradas, além do uso do valor de 0,01 mg/kg como ponto de corte. "O relatório de 2010 menciona que os resíduos detectados nas amostras, mesmo que estejam em uma concentração abaixo de 0,01 mg/kg, considera que o risco não deve ser descartado. O relatório de 2011/2012 não menciona esse valor. O relatório de 2016 muda a interpretação ao observar que os resíduos detectados nas amostras não representam risco à saúde do consumidor por estarem em concentração abaixo de 0,01mg/kg. Estamos consumindo muito mais agrotóxicos do que deveríamos", advertiu Meirelles.
O pesquisador finalizou sua apresentação reforçando que a presença de resíduos de agrotóxicos nos alimentos in natura configura um problema recorrente, o qual merece mais atenção dos atores envolvidos, bem como dos órgãos de Vigilância, uma vez que os resultados insatisfatórios foram percebidos em todos os relatórios. “É necessário uma tomada de medidas que solucionem os problemas apontados nos relatórios - como a incorporação da análise fiscal -, pois contribuiria para mudanças no processo produtivo dos alimentos, servindo como referência para responsabilizar os setores varejistas e os setores de produção agrícola, quando necessário”, concluiu Meirelles.