O Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional (NPII), da Fundação Getulio Vargas, promoveu o ciclo de palestras “Teerã, Ramalá e Doha - Memórias da Política Externa Ativa e Altiva”, comandadas pelo ex-ministro Celso Amorim. O evento, que foi realizado no último mês, girou em torno de três casos, narrados pelo palestrante em livro lançado este ano, unidos por um ponto em comum: a construção de uma política externa ativa e altiva, condizente com o papel internacional do Brasil.
No primeiro encontro, foi debatida “A Declaração do Teerã: Oportunidade Perdida?” e a efetiva participação do Brasil na negociação entre os Estados Unidos e o Irã para fechar o acordo de troca de combustível nuclear entre 2009 e 2010. Na época, apesar dos esforços empreendidos por Brasil e Turquia que culminaram na aceitação do acordo pelo Irã, este não foi colocado em prática, pois as sanções previamente estabelecidas pelos EUA ao país permaneceram. “Aos poucos, nós fomos nos afastando do processo, pois não tinha mais nenhum sentido continuarmos”, contou o ministro.
Recentemente, os dois países acabaram fechando um acordo nuclear. Quando perguntado se existe ressentimento, Celso Amorim respondeu: “nenhum”. “Eu, particularmente, aplaudo esse acordo devido à sua importância. No entanto, chamo sempre a atenção para dois pontos. Primeiro, perdeu-se tempo. Embora os acordos tenham diferenças entre eles, o atual teria sido feito muito mais rapidamente se a declaração de Teerã tivesse sido aceita. Segundo, teria partido de uma base muito melhor, já que naquela época o Irã possuía 2.000Kg de urânio levemente enriquecido e hoje tem 10.000Kg”, avaliou.
Já a segunda palestra abordou especificamente a política brasileira de aproximação com os países árabes do Oriente Médio e Israel. “Em comum com o que debatemos no último encontro, está a tentativa de chegada do Brasil ao que é chamado de ‘o grande jogo da política internacional’”, analisou. Neste contexto, Celso Amorim destacou a participação do Brasil como membro eleito do Conselho de Segurança da ONU no período de 1998 a 1999 e a criação dos painéis sobre Iraque, presididos pelo Brasil, além da fundação da Cúpula América do Sul - Países Árabes (ASPA) com a ideia de ter uma institucionalização para a relação entre as duas partes. “O surgimento da ASPA foi também um processo de aprendizado e é importante que esse aprendizado não seja apenas pessoal, mas também institucional”.
“O Oriente Médio é e tem sido nos últimos 50 anos grande foco de tensões com potencial de se tornar um conflito mais amplo, então, de alguma maneira, também era importante que o Brasil viesse a ter uma maior participação neste cenário. A isso tudo, juntam-se interesses de natureza comercial, cultural, técnica e científica, além da presença muito grande de árabes na população brasileira. Tais fatores levaram à decisão de se aproximar dos países árabes”, observou o diplomata. Já com relação a Israel, Celso Amorim considera que, apesar de a mídia brasileira afirmar que a ASPA era uma agressão ao país, a aproximação foi ainda maior pela confiança no Brasil, acarretando reflexo nas relações comerciais. “Inclusive, o primeiro acordo do Mercosul fora da região foi com Israel”.
Para encerrar o ciclo de palestras, no terceiro encontro, Celso Amorim falou sobre as complexas e delicadas negociações da Rodada de Doha na Organização Mundial do Comércio (OMC), que visam diminuir as barreiras comerciais em todo o mundo, com foco no livre comércio para os países em desenvolvimento. Mais especificamente, ele dissertou sobre desdobramentos da Rodada Uruguai e da chamada “Rodada do Milênio” e do importante papel desempenhado pelo Brasil nas negociações, principalmente naquelas a respeito da agricultura.