Uma doença de sintomas silenciosos, mas que pode ser fatal. O benzenismo - intoxicação por benzeno - foi um dos principais assuntos discutidos no Seminário Campanha Estadual de Segurança e Saúde - Projeto Postos de Combustíveis que encerrou a semana de atividades sobre a saúde dos frentistas, ocorrida no final do mês de setembro, no Rio de Janeiro. Organizado pelo sindicato da categoria, o evento contou com a participação de dois pesquisadores da ENSP: Antônio Sérgio de Almeida e Rita Mattos, ambos do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh). Esteve presente, também, o ministro do Trabalho, Manuel Dias, além de procuradores, líderes sindicais e frentistas.
Abrindo o seminário, o ministro Manuel Dias lembrou da importância dos estudos em saúde do trabalhador. “É um tema que deveria ser abordado nas escolas, nas aulas do ensino fundamental, para que se mude a mentalidade que se tem hoje sobre o assunto. A ditadura alienou quatro gerações, criminalizou a política e fez com que a presença do trabalhador no Congresso Nacional tivesse uma grande queda. Não é a toa, temos, no momento, um dos congressos mais conservadores da República”.
Manuel Dias aproveitou a ocasião para lembrar da importância da Petrobras na economia nacional e a urgência de se recuperar a empresa, que para o ministro é o centro das disputas na atual crise política.
E se a Petrobras é o pivô da crise atual e um dos motores da nossa economia, isso também se dá graças àquele funcionário lá na ponta, com a mangueira na mão, pronto para abastecer os tanques dos carros que vãos aos postos de gasolina. E foi principalmente para eles que foi dirigido o seminário, como lembrou Eusébio Pinto Neto, presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos postos de combustíveis do Rio de Janeiro, o Sinpospetro. “Nós queremos chamar a atenção para a importância desse trabalhador. O frentista, além de estar exposto aos riscos de sua profissão, ainda cumpre vários papéis: abastece os carros, dá informações. E os postos são locais onde as pessoas vão para comer, etc”.
Segundo dados do último censo, o Brasil tem hoje 184.733 frentistas. Segundo a ANP, são quase quarenta mil postos de combustíveis ativos.
A procuradora Janine Fiorot, do Ministério Público do Trabalho, lembrou que tem recebido denúncias sobre formação de cooperativas para contratação de frentistas, o que é proibido, e também a respeito das jornadas de trabalho.
A contaminação por benzeno, entretanto, foi o foco da campanha, que durou uma semana e foi realizada em postos de todo o estado do Rio. Foram distribuídas cartilhas e cartazes que traziam informações sobre práticas que deixam os trabalhadores mais expostos ao benzeno. Entre elas está o hábito, bastante difundido, de se abastecer os tanques além da trava de segurança, o click. Quando isso ocorre, não só o frentista, mas também o cliente e todos os que estão próximos ao posto ficam expostos.
Juliana Moura, da PUC-RS, apresentou dados de uma pesquisa nacional para mostrar o perigo da contaminação por benzeno. “Desde 1982 o benzeno é considerado cancerígeno pela Iarc, a agência internacional da ONU para pesquisas sobre o câncer. A substância está associada à leucemia”, disse Juliana.
As pesquisas nessa área têm esbarrado em conflitos de interesses e dificuldade de receber informações das empresas. Rita Mattos, do Cesteh/ENSP, falou sobre essa dificuldade, na chegada aos postos de gasolina. “Nós no Cesteh não temos poder de vigilância. Nosso grande objetivo é empoderar o trabalhador. Que ele leia o exame, saiba o que está escrito ali e acredite ou não naquele exame. E também queremos promover um empoderamento do SUS para que, a partir de uma pergunta básica - ‘Você trabalha em quê ?’ - seja possível relacionar o sintoma relatado com o processo de trabalho do paciente”.
Nós estamos falando de uma substância que, segundo a ONU, é a 6ª mais perigosa que existe. Eu não acredito, como todo um grupo de cientistas também não acredita, que exista um limite um limite seguro para a presença do benzeno na gasolina, conta Rita.
Antônio Sergio de Almeida, também do Cesteh/ENSP identifica uma contradição nas tentativas de se identificar precocemente trabalhadores que tenham mais riscos de se intoxicar com o benzeno. “Identificar quem tem mais risco de adoecer pode ser um tiro pela culatra, já que pode fazer com que a empresa dispense esse trabalhador”.
Sobre os sintomas do benzenismo, Antônio Sergio destacou a dificuldade que se tem em identificá-los. “Dor no corpo, cansaço, sonolência, tontura. Certamente, muitos aqui já sentiram algum desses sintomas, pelos motivos mais diversos. Por isso temos tanta dificuldade em identificar o que é benzenismo. Quem trabalha com benzeno deve fazer o hemograma completo com frequência”.
Ao abrir a palestra para o debate, os participantes foram confrontados com diversos relatos de frentistas sobre práticas que os deixam expostos ao benzeno. Um caso corriqueiro é o paninho que muitos deles carregam nos bolsos, para limpar as mãos, e que deve ser evitado. Além disso, há ainda a exposição daqueles que trabalham com óleo, entre outros.
Um dos pontos que esbarra na relação trabalhador-empresa é a lavagem dos uniformes. Os pesquisadores foram unânimes em dizer que o serviço é de responsabilidade das empresas. Do contrário, ao levar o uniforme para casa o trabalhador pode contaminar sua família.