Desde sempre o homem vem sido seduzido pelas narrativas, sejam elas de ordem simbólica ou realista, que diretamente ou indiretamente falam da vida, relacionando-as com deuses ou com os próprios homens . Uma possível explicação para esse fascínio estaria no fato de que provavelmente, desde a origem dos tempos o homem vem sentindo a presença de poderes maiores que a sua vontade, e de mistérios que sua mente não consegue explicar ou compreender . Na tentativa de amenizar essa ânsia permanente de saber e de domínio sobre a vida, surgem as narrativas populares, formando uma heterogênea matéria narrativa . Todas essas formas de narrar nasceram entre os povos antigos, foram transformadas, acrescentadas confundidas e assim espalharam-se por toda parte e estão vivas até hoje, seja nos livros, na memória nas rodas de história etc...
Duas dessas narrativas destacam-se, pois conseguiram grandes divulgações e atravessaram séculos, são os Contos de Fadas e os Contos Maravilhosos . É importante diferença-las, pois ambas nasceram de fontes diferentes e tem enfoques distintos .
O Conto de fadas expressa uma atitude humana que refere-se a luta do eu , ou seja, a nível do existencial, onde tudo gira em torno do casamento homem x mulher .
Por sua vez os Contos maravilhosos tratam das realizações no plano material, profissional, de realizações externas, ao nível social .
Vale lembrar que uma não anula a outra, as duas se completam em uma realização integral .
Também chamados de Contos da Carochinha, os Contos de fadas surgiram no Brasil e em Portugal no final do século XIX , e nem sempre tem a real presença de fadas como diz o nome. São desenvolvidos dentro da magia feérica (reis , rainhas, príncipes, bruxas, gigantes anões, animais, objetos mágicos, tempo e espaço fora da realidade conhecida etc.) . Tem como eixo gerador uma problemática existencial, a realização do herói ou da heroína alcançando seus objetivos, essa realização intimamente ligada à união homem mulher .
A estrutura básica de um conto de fadas é uma narrativa curta, dotada de tempo, espaço,clímax, enredo e o número reduzido de personagens.
Na literatura infantil a linguagem deve ser usada como instrumento de criação, revelação e direção. Dizemos linguagem para nos referir-se não só a forma com que ela se apresenta, mas também para a intenção total da obra, seus arranjos e seus objetivos .
No conto Dona Baratinha percebemos que o seu léxico é adequado à literatura infantil, não contendo rebuscamento de termos ou emprego de palavras grosseiras, possuindo clareza e simplicidade de estilo .
A linguagem do conto é repleta de onomatopéias e diálogos, o que desperta o interesse das crianças . Veja algumas falas abaixo :
"–Gato! Como é que fazes de noite ?"
"- Faço miau! miau !"
"-Cachorro ! Como é a tua fala a noite ?"
"-Uau ! Uau !"
Outro aspecto que não deve ser ignorado é que o conto Dona Baratinha não possui gírias, o que o torna ainda mais fácil de ser compreendido e lhe garante ser atual . Como a maioria dos contos sempre se volta para palavras mágicas ou mesmo frases que se repetem ao longo do texto, Dona baratinha não poderia ser diferente, durante toda a história notamos a forte presença da pergunta que a protagonista faz a todo candidato a noivo :
"-Queres casar comigo ?" (o que funcionaria como um "abre-te sésamo", ou "Rapunzel jogue as tranças") .
Outro tipo de linguagem contida na fábula é a das ilustrações, uma linguagem não verbal, mas tão expressivo quanto .
No início da história percebe-se um cenário todo colorido, arborizado e com casinhas, mostrando um local calmo, tranqüilo e pacato, nota-se também que essas ilustrações não são tecnicamente perfeitas, pois são desproporcionais ao tamanho da protagonista, além disso os traços das figuras se assemelham aos desenhos feitos por crianças . Essas características servem como recursos para atrair o pequeno leitor, entrando assim no seu vasto mundo imaginário . Ao longo da fábula nota-se que as cores que antes eram claras, passam a ficar mais fortes e mais escuras, preparando o leitor para algum acontecimento importante, esse acontecimento chama-se clímax, na verdade essas cores que se tornam fortes funcionam como um " Parananam!!!!!!!! " dos filmes e novelas .
Pode-se dividir um conto de fadas em partes :
Enredo: É o conjunto de fatos que se subdivide em :
Introdução : Coincide geralmente com o começo da história onde são apresentados os fatos iniciais e os personagens. Enfim é à parte em que se situa o leitor diante do que irá ler .
Complicação: É a parte do enredo na qual se desenvolve o conflito .
Clímax – Como já foi citado assim é o momento culminante da história . Ele é o ponto de referência para as outras partes do enredo, que existem em função dele.
Desfecho- É a solução dos conflitos, boa ou má, com final feliz ou não .
Tempo- Constitui o pano de fundo para o enredo . A época da história nem sempre coincide com o tempo real em que foi publicada ou escrita . Os contos de um modo geral apresentam uma duração curta em relação aos romances. Algumas narrativas dão dicas da época que estão retratando através de frases do tipo: "Era no tempo dos reis" ou "No tempo em que os bichos falavam".
Espaço- É o lugar onde se passa a ação de uma narrativa .O termo espaço só dá conta do lugar físico onde ocorrem os fatos da história .
Ambiente- É o espaço carregado de características socioeconômicas, morais, psicológicas, em que vivem os personagens .
Narrador- É o elemento estruturador da história, pode estar em terceira pessoa, que se divide em onisciente e onipresente . O primeiro sabe tudo da história e o segundo está presente em todos os lugares da narrativa. Outro tipo de narrador é o primeira pessoa, a qual participa diretamente do enredo como personagem .
Vamos analisar melhor essas estruturas situando-as no conto da Dona Baratinha:
Enredo
Exposição – O começo da história da Baratinha, onde ela está em sua casa e é apresentada como a protagonista do conto.
Complicação – Dom Ratão em seu apartamento começa a sentir o cheiro de Toucinho .
Clímax – É quando Dom Ratão cai na panela de Feijoada e se suja todo .
Desfecho – dona Baratinha não pode se casar e volta para a janela a espera de um novo noivo .
Personagens
Personagens: Principais ; Baratinha , João Ratão .
Secundários ; Cão , Boi e Gato .
A história da Baratinha apresenta como personagens principais ; a Baratinha e João Ratão , e como figuras secundárias ; o Boi , o Cão e o Gato . As personagens do conto encarnam virtudes ou defeitos , que são exaltados no mais alto grau . Essas qualidades estão sempre em oposição e , esse conflito empresta ao conto um colorido vivo e intenso . As qualidades são físicas e espirituais . As físicas são a grande e a pequena estatura , a força e a fraqueza , o formato e a maneira de agir . As espirituais são a bondade e a maldade , a obediência e a desobediência , a modéstia e o orgulho, coragem e o medo , a curiosidade , a sedução , a sexualidade , a esperteza e a sensibilidade .
A personagem Baratinha representa a sexualidade , a fragilidade, a esperteza , e a sensibilidade da mulher :
A sexualidade feminina é representada pelo formato e cheiro da barata que apresentam características da mulher .
A fragilidade feminina é representada pelo fato da barata ser um animal muito pequenino , que vive se escondendo nos buracos com medo de ser capturada.
A esperteza feminina é representada pelos movimentos rápidos da barata , reza a lenda que ela ver os humanos em câmera lenta .
A Baratinha queria se casar , simbolizando com esse ato a busca feminina , porque aos olhos da sociedade de antigamente toda mulher precisava se casar , se não ficaria para titia (solteirona) , o que era o grande medo das mulheres .
O cheiro da barata é a sedução que as mulheres exercem sobre os homens , através dessa sedução , as mulheres se sentem poderosas , espertas e muito mais .
Quanto ao personagem João Ratão , representa a sexualidade masculina , que está visceralmente ligada à união , homem , mulher , deve-se ao fato de os ratos viverem procurando os buracos para se esconder , enfatizando dessa maneira a necessidade básica do homem , o sexo , a procura de sua parceira , representada na história pela barata.
O nome João Ratão representa o poder que o homem exerce sobre a mulher perante a sociedade , referindo-se ao fato de que , quando um homem se casava com uma mulher , esta era obrigada a utilizar o sobrenome do homem . (atualmente por lei não é mais obrigatório) .
O fato de João Ratão ter morrido desastradamente dentro de uma panela quente , refere-se a fragilidade , a curiosidade do homem que está oculta, ele se sente seduzido pelo cheiro da mulher , representada na história pelo cheiro da panela , ou seja através da sedução a mulher pode dominar o homem.
Os personagens secundários da história representam os homens desajeitados , que não conseguem conquistar as mulheres , em vista disso ficam sozinhos .
Tempo
Na fábula o tempo cronológico da história é fictício, pois não pode ser localizado no calendário Cristão .
Espaço
A narrativa se divide em três espaços: casa de Dona baratinha a floresta em que passam os candidatos a noivos e a janela da casa. O começo da história tudo gira em torno de sua casa, ao passarem os candidatos nota-se a divisão entre a janela e a floresta, e por fim a igreja em que todos esperam o noivo guloso.
Ambiente
A casa de Dona Baratinha é um ambiente que caracteriza um personagem de classe econômica baixa, pois é uma casinha bem simples, porém muito arrumada, mostrando o quão caprichada é a protagonista . O outro espaço que é mostrado é a floresta que se assemelha com uma comunidade onde só animais fazem parte . essa floresta é bem cuidada, colorida e toda enfeitada para o acontecimento mais esperado,o casamento.
Narrador
O narrrador de a dona Baratinha está em terceira pessoa e é onisciente, pois ele não apenas narra o que se passa com os personagens, mas também o que sentem, em outras palavras ele sabe mais que os personagens.
Todo conto traz a sua mensagem, uma espécie de lição para a vida toda. O que pode ser aproveitado como exemplo no conto da Baratinha é a importância do dinheiro na sociedade em que vivemos . Em algumas versões da história a protagonista precisa pagar pelos serviços do Jabuti com todas as suas economias e mais um cacho de bananas. Essa passagem do texto nos permite fazer uma crítica com a realidade em que vivemos, onde tudo é pago e ainda assim sempre fica faltando alguma coisa .
Outra importante lição tirada da narrativa é que não existe esse alguém tão perfeito conforme imaginamos, de modo que deve-se saber que todos possuem defeitos e que apenas com a convivência é possível conhecer as inúmeras qualidades das pessoas .
Ao encontrar nesses personagens mensagens construtivas, os jovens e as crianças paulatinamente adquirir conceitos positivos para suas vidas . Por isso a importância dos contos, a fim de se formar jovens mais críticos e mais éticos
Mini-conto
É uma narrativa muito curta que pode abordar qualquer tipo de tema. Sua estrutura básica é formada pelos seguintes componentes:
- Personagens
- Narrador
- Espaço
- Tempo
- Símbolos
A análise desses componentes se dará a seguir:
A narrativa Proustiano nos conta as peripécias de um adolescente que ao espiar uma biblioteca sente-se atraído por ela e desapercebidamente a penetra .
Em uma hora morta do dia em que as mulheres estão atarefadas demais para notá-lo, e os homens descansando, o menino que era proibido pelo tio de visitar a biblioteca não resiste a curiosidade e começa a espiá-la e quando se dá conta já está lá dentro . Embora ali só houvesse livros para adultos o menino aleatoriamente escolhe um e começa a ler. A medida que ia lendo era tomadoor uma sensação de bem estar avassaladora e inesplicável, foi quando lembrou que quando bem pequeno ele sentia esta mesma sensação, só que quando salvava mariposas de serem seduzidas pelo reflexo da água .
Temos aqui um narrador em terceira pessoa, que não participa da história mas que sabe exatamente o que se passa na cabeça de seu personagem.
Ao analizarmos o mini-conto percebemos que ele possui um reduzido número de personagens, que aparecem sob a forma de pessoas . Temos o protagonista que é entitulado pelo narrador como "menino", já mostrando o seu desprezo para com ele. Temos os personagens secundários que pode-se dizer que são as outras crianças que moravam na casa também o tio, que queria mantê-las longe de sua sedutora biblioteca .
Ao falar da narrativa ,se pode citar que ao início do mini-conto é apresentado o conflito , e que todos os acontecimentos presentes no texto irão girar em torno deste conflito . Este já o é senão a proibição da entrada na tentadora biblioteca,e o doce sabor de nela penetra e se deliciar com o sabor da leitura.
Pode- se fazer uma ponte entre o conto analizado e o livro de Roland Bart O prazer do texto, pois os dois textos falam do prazer da descoberta pela leitura, cada um do seu jeito e dentro da sua expectativa.
Em relação ao espaço em que se passa a narrativa, nota-se que ele não se divide, tudo começa dentro da biblioteca e lá se desenvolvem todos os outros acontecimentos . Embora nosso protagonista se lembre de alguns fatos que aconteceram há alguns anos, isso não interfere no espaço em que se desenvolve a história .
É possível notar que o tempo em que se passa a narrativa não é muito atual, isso é percebido quando o narador descreve a concepção do tio em relação ao menino, chamando-o de criança e o proibindo de entrar na biblioteca. Atualmente a idade que o menino estava,14 anos, ele já não seria mais considerado como uma criança, e sim como um adolescente que está na escola e que certamente estaria acostumado com os livros.Por isso a prática de se chamar de criança um menino de 14 anos não é atual . Assim como a maioria dos mini-contos, até mesmo por não disporem de muito espaço, o Proustiano não toca na passagem do tempo, o autor escolhe um período da vida do personagem para comentar e descrever, mesmo que sejam feitas menções a épocas passadas, elas servem apenas para ilustra a narrativa e nã para de fato mostrar a passagem do tempo.
É proposto ainda a utilização de alguns símbolos na narrativa. Temos a biblioteca que remete a idéia de sabedoria e conhecimento, encontrados nos livros . temos também a tentativa adotada pelo menino, salvar mariposas, transparecendo assim na esfera simbólica toda a pureza, inoscência e fantasticidade de uma criança . Pode se dizer mais, que através do cheiro que é emanado dos livros se faça uma ponte com o livro o Banquete de Platão, onde ten-se no texto a metáfora de liberdade, metaforizada no conto pelo cheiro que é percebido pelo menino.
Temos embutida,na narrativa a questão da verossimilhança, que é a lógica interna do enredo, tornando-o ou não verdadeiro para o leitor . Os fatos contidos em um mini-conto não precisam ser verdadeiros,no sentido de corresponderem exatamente a fatos ocorridos no universo exterior ao texto, mas devem ser verossímeis, isto quer dizer que mesmo sendo inventados, o leitor deve acreditar no que lê . Esta credibilidade advém da organização lógica dos fatos dos fatos dentro do enredo .
A nível de análise de narrativas são esses os aspecto que devem ser ressaltados, a fim de se compreender e explorar um mini-conto dentro de suas possibilidades.