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domingo, 15 de dezembro de 2013

Artigos: Velhice

Em muitas culturas e civilizações, a velhice é vista com respeito e veneração: representa a experiência, o valioso saber acumulado ao longo dos anos, a prudência e a reflexão. A sociedade urbana moderna transformou essa condição, pois a atividade e o ritmo acelerado da vida marginalizam aqueles que não os acompanham.
Velhice é o último período da evolução natural da vida. Implica um conjunto de situações -- biológicas e fisiológicas, mas também psicológicas, sociais, econômicas e políticas -- que compõem o cotidiano das pessoas que vivem essa fase.
Não há uma idade universalmente aceita como o limiar da velhice.
As opiniões divergem de acordo com a classe socioeconômica e o nível cultural, e mesmo entre os estudiosos não há consenso. Para efeitos estatísticos e administrativos, a idade em que se chega à velhice costuma ser fixada em 65 anos em diversos países, após o que se encerra a fase economicamente ativa da pessoa, com a aposentadoria. Atualmente, nas nações mais desenvolvidas, esse limite não parece absolutamente adequado do ponto de vista biológico, pelo que a Organização Mundial da Saúde (OMS) elevou-o para 75 anos.
Para compreender tal transformação, é preciso ter em conta o aumento progressivo da longevidade -- e, portanto, da expectativa de vida -- que se produziu nas últimas décadas do século XX, fato sem precedentes na história. O fenômeno se deve aos avanços na área de saúde pública e da medicina em geral, e à melhoria das condições de vida em seus mais variados aspectos. Por isso, é cada vez maior o número de pessoas que ultrapassam a idade de sessenta e setenta anos e, mais que isso, que atingem essa idade em boas condições físicas e mentais.
O crescimento do percentual de idosos, sobretudo nos países desenvolvidos, pôs em evidência a problemática relacionada à velhice, tanto do ponto de vista estritamente médico quanto do socioeconômico. A questão ganhou, assim, nova relevância entre as preocupações dos governos, da sociedade e dos meios científicos.
Aspectos biológicos.
O processo biológico do envelhecimento afeta todos os seres vivos. As células, órgãos e organismos encontram-se sujeitos a contínuo desgaste e à degeneração progressiva que conduzem -- depois de intervalos variáveis -- à alteração irreversível do funcionamento fisiológico e à morte. Os sistemas de homeostase e auto-regulação, que permitem aos seres vivos manter-se em delicado equilíbrio com o meio, começam gradualmente a funcionar de maneira pouco eficaz ou insuficiente. As toxinas acumulam-se no organismo, o ritmo de reparação das estruturas orgânicas decresce e a capacidade de recuperação e as funções vitais do indivíduo declinam.
O envelhecimento humano é caracterizado orgânica e biologicamente pelos seguintes sinais: aparecimento de rugas e progressiva perda da elasticidade e viço da pele; diminuição da força muscular, da agilidade e da mobilidade das articulações; aparição de cabelos brancos e, eventualmente, perda definitiva dos cabelos (alopecia) entre os indivíduos do sexo masculino; redução da acuidade sensorial, particularmente no que se refere à capacidade auditiva e visual; declínio da produção de certos hormônios, o que afeta a capacidade auto-regenerativa dos tecidos e conduz à atrofia da atividade formadora de gametas (climatério); distúrbios nos sistemas respiratório, circulatório (arteriosclerose, problemas vasculares e cardíacos etc.), urogenital etc.; e alteração da memória.
Não há comprovação de que o avanço da idade determine a deterioração da inteligência, que parece estar associada à educação e padrão de vida. A atividade sexual, que tende a diminuir com a idade, pode na verdade ser mantida indefinidamente por indivíduos fisicamente saudáveis.
A gerontologia -- disciplina que se ocupa do idoso de diferentes pontos de vista -- progrediu muito na segunda metade do século XX, sobretudo no que se refere à geriatria, ramo da medicina que estuda as doenças da velhice e seu tratamento. Todas as especialidades médicas referentes ao adulto interessam à geriatria, mas a ocorrência mais freqüente de determinados quadros patológicos nos velhos fez com que eles fossem encarados de forma privilegiada. Assim ocorre com a cardiologia e a neurologia, pois as cardiopatias e problemas vasculares, as disfunções neurológicas e os reumatismos são alguns dos principais problemas que afligem a população idosa.
Repercussões psicológicas, sociais e econômicas.
O envelhecimento é um processo natural e inevitável, mas pode ser vivido em melhores ou piores condições. A gerontologia é capaz de prescrever procedimentos preventivos no que se refere à saúde física e mental do velho. Doenças como a arteriosclerose e a obesidade, grande número de distúrbios digestivos e vasculares, além de certas lesões urogenitais, podem ser evitadas ou muito atenuadas com dieta adequada, exercício moderado e acompanhamento médico periódico.
Entretanto, a progressiva degeneração física e os distúrbios orgânicos ainda incontornáveis da velhice desencadeiam grande ansiedade na maioria das pessoas. Sobrepostos ao real declínio das funções biológicas, abundam preconceitos sobre o envelhecimento, assim como temores e medos fantasiosos. Outros fatores podem agravar a situação, como a consciência da aproximação do fim da vida; a suspensão da atividade profissional por aposentadoria e a conseqüente sensação de inutilidade; a solidão e o afastamento de pessoas de outras faixas etárias, cada vez mais freqüentes devido à desagregação familiar nas sociedades desenvolvidas; e a situação econômica precária, em decorrência da progressiva redução de renda a que está exposto o aposentado.
É freqüente que a falta de motivação do idoso e sua tendência à depressão cheguem a ocasionar perda de reflexos e deterioração da memória e da capacidade intelectual, mesmo que não haja justificativa orgânica para tanto. A apatia pode, no entanto, repercutir organicamente, no sentido de acelerar o envelhecimento ou de provocar distúrbios que provavelmente não se produziriam, caso fosse mantida a vitalidade mental e emocional.
O número de pessoas de mais de 65 anos de idade tem crescido rapidamente nos países desenvolvidos e tende a crescer ainda mais, conforme revelam estudos demográficos e estatísticos. O gradual envelhecimento da população traz conseqüências econômicas e sociais relevantes, como a redução proporcional da população economicamente ativa e o aumento paralelo dos encargos econômicos da nação, que deve arcar com maior número de pensões, programas sociais, programas de saúde etc.
Embora a idade avançada seja ainda considerada um trunfo em certos ramos de atividade, sobretudo na política, a tendência é que as pessoas sejam forçadas à aposentadoria apesar de potencialmente produtivas. Isso porque, ao progresso da medicina quanto à conservação da saúde, não correspondeu uma ampliação do mercado de trabalho, capaz de absorver toda a população ativa. O fenômeno é mundial e não estão livres dele os países desenvolvidos: os mais velhos, mesmo saudáveis, são parcela significativa da mão-de-obra excedente.
A importância social de um grupo etário relaciona-se a sua influência efetiva na sociedade. A experiência de vida, assim como o conhecimento adquirido por meio dela, prerrogativa dos mais velhos, é valorizada sobretudo em culturas de tradição oral e ágrafa. O declínio de prestígio do velho na sociedade industrial é a contrapartida do valor adquirido pelo próprio saber científico, que desconsidera a experiência quotidiana e a tradição em favor de outros métodos de determinação da verdade.
Pesquisas mostraram que, à medida que envelhecem, as pessoas preferem permanecer onde moram, enquanto a população jovem dos países industrializados tende a ser bastante migratória. Os velhos vêem-se obrigados a optar entre mudar-se para seguir a família ou permanecer em local conhecido, igualmente sujeito, porém, a rápidas transformações que alteram seus padrões habituais de atividade.
Os valores e educação específicos de cada geração contribuem para as dificuldades de adaptação do segmento mais velho da população ao novo contexto social, sobretudo nos grandes centros urbanos, onde as transformações são mais aceleradas. Os aspectos sociais da velhice são, portanto, determinados pela conjunção de diferentes fatores: os efeitos fisiológicos do envelhecimento; as experiências coletivas e os valores da geração mais velha; e a organização da sociedade, tal como é encontrada por essa geração ao envelhecer.