“A saúde é direito de todos e dever do Estado”, é o que garante o artigo 196 da Constituição Federal, de 1988. Porém, há décadas o país sofre forte influência de setores conservadores mantendo aspectos de atraso nas instituições nacionais, inclusive em relação à saúde, que, apesar de ser considerada um direito de todos a ser assegurado mediante políticas do Estado, continuou ‘livre à iniciativa privada’. Desde então, o SUS vem enfrentando uma competição desigual com o chamado setor suplementar. Para informar cidadãos, esclarecer dúvidas, instrumentalizá-los e servir de subsídio para os debates da agenda da saúde nas eleições e da próxima Conferência Nacional de Saúde, foi lançado pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) o manifesto Por que defender o SUS? Diferenças entre Direito Universal e Cobertura Universal de Saúde.
O documento, didático e permeado por críticas e proposições, foi construído em uma linguagem simples e direta visando atingir diferentes públicos. Na verdade, a ideia é que ele seja acessível à todos, desde gestores até representantes de movimentos sociais, passando por jovens, alunos de graduação, políticos e outros. A pesquisadora do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde (Daps/ENSP), vice-Presidente do Cebes e coordenadora do Programa de Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Saúde Pública (PDTSP/VPPLR/Fiocruz), Isabela Santos, é quem está à frente do projeto, no qual o manifesto está inserido.
Segundo ela, além de um texto base que vem sendo usado como subsídio para discussões em núcleos regionais do Cebes, esse grande projeto de discussão sobre a universalidade no Brasil engloba outros materiais a serem gerados a partir do texto base e das discussões, como o próprio manifesto e, em breve, spots e história em quadrinhos – todos objetivam disseminar conhecimento de forma sucessiva para diferentes públicos e com diferentes abordagens, em todo o país.
Este projeto é do Cebes e, para o seu desenvolvimento, recebeu o apoio da Medico International, que é uma Organização Não Governamental alemã conhecida por seus trabalhos no campo progressista e de esquerda. O texto do manifesto esclarece que direito universal à saúde diz respeito à possibilidade de todos os brasileiros serem cuidados pelos serviços de saúde públicos. ‘Pois gozar deste direito é uma condição de cidadania, diferente de quando se paga por ela, pois, nesse caso, o indivíduo passa a ser consumidor. Já a proposta de “cobertura universal de saúde”, na verdade, é um modelo de sistema de saúde liberal baseado na defesa do lucro das empresas privadas e do mercado, em prejuízo do direito de todos à saúde’.
Isabela alerta que essa nova dimensão: a de “cobertura universal da saúde”, apesar de utilizar da ideia da universalidade, visa combater o conceito de direito universal à saúde para fortalecer o papel do setor privado na oferta de serviços de saúde e de seguros privados. Segundo o manifesto, a manutenção da saúde como um negócio que visa lucro garantiu a expansão do setor privado de saúde brasileiro, hoje um dos maiores e mais poderosos do mundo. Esse mercado atua impondo dificuldades para barrar o direito universal à saúde, que precisa ser consolidado por meio do SUS público, forte e eficiente.
Além de Isabela, o grande projeto de universalização conta com a participação das pesquisadoras da ENSP Luisa Regina Pessôa e Lígia Giovanella e do pesquisador do Instituto de Medicina Social/Uerj Paulo Henrique de Almeida Rodrigues. O texto já foi debatido com mais de 1.500 conselheiros de saúde na XVIII Plenária Nacional de Conselhos de Saúde Ampliada. O próximo debate do manifesto promovido pelo Cebes acontecerá durante o Encontro Nacional de Estudantes de Medicina. O Cebes também está promovendo debates em seus núcleos distribuídos pelo país, com escolas em encontros com representantes das escolas da Educação de Jovens e Adultos e da Rede Pública e; está se articulando com partidos políticos para, assim, tentar interferir nas suas propostas de governo para a área da saúde, nesse sentido está sendo planejado um debate com o os candidatos ao governo do estado do Rio de Janeiro.
Isabela convidou a todos para o debate: “Pedimos todos os tipos de crítica, não apenas de conteúdo, mas também de forma e construção, pois queremos melhorar a cada material elaborado. A divulgação está maciça nas redes sociais, mas precisamos da ajuda de todos para alcançarmos o maior número de pessoas, entidades e instituições”, comentou ela, dizendo ainda que “disseminar a informação, fazendo com que as pessoas tenham acesso aos documentos e, assim, possam se instruir quanto ao tema e assumir uma posição para atuar na sociedade em que vivemos é o nosso grande objetivo”.