A BOFETADA
Virou-se para as coleguinhas:
Como meu namorado, eu confesso francamente: eu nunca vi! Tem um gênio! Que gênio! Se é feroz? Puxa! Precisa uns dez para segurar! Vocês sabem o que ele fez comigo? Não sabem? Foi o seguinte: ele cismou que eu tinha dado pelota para o Nemésio. E não conversou : me sentou a mão, direitinho! Eu gosto de homem, homem. Escreveu, não leu, o pau comeu. Senão, não tem graça. Sou assim.
Acontece que entre as colegas presentes estava Silene, amiga e confidente de Ismênia. E Silene foi justamente a que se impressionou mais com o episódio. Não resiste. Apanha o telefone e liga para o emprego do Sinval. Queria apenas passar um trote, e nada mais. Do outro lado da linha, porém, Sinval, caricioso, mas irredutível, exigia:
- Se não disse o nome, eu desligo.
Ia recuar. Mas deu nela uma coragem súbita. Identificou-se: “Sou eu Silene”. Arrependeu-se imediatamente depois de ter dito. Tarde, porém. E já Sinval, transfigurado, exclamava:
Silene? Não é possível, não pode ser! No telefone, aceitara o convite de Sinval para um encontro no dia seguinte. Apaixonara-se, de uma dessas paixões definitivas; reais e mortais. Continuou a encontrar-se com o ser amado, às escondidas. Só não era mais feliz porque pensava na outra. “No dia em que Ismênia souber...”. Chegou esse dia. E foi, entre as duas, uma cena desagradabilíssima.
- Excluída Ismênia, oficializou-se o romance. Os dois puderam exibir, ostentar, em toda a parte, o imenso carinho em que se consumiam. Começaram a freqüentar festas. E, então, surpresa. Silene descobriu o seguinte: Sinval não se incomodava que ela dançasse com todo mundo. Você não tem ciúmes de mim? Não.
Até que certa vez, a garota resolve ir mais longe. Pergunta ousadamente:
- E se eu te traísse? Tu farias o quê?
- Te perdoaria.
- E se eu voltasse a te trair?
- Se continuasses traindo, eu continuaria perdoando.
A partir de então, foi outra alma, outra mulher, com atitudes desagradáveis, de escândalo. Nas festas, dançava com o rosto colado. Uma noite, vão a uma outra festa. Quase à meia-noite, de braço com um cara, vai para o jardim. Sinval espera vinte minutos, meia hora, uma hora. E não se contém mais: vai procurá-la. O cara, assim que o viu, pigarreou, levantou-se e desapareceu. Silene ergueu-se também. Com um meio sorriso maligno, anuncia: “Ele me beijou.”
Sinval não disse uma palavra: derruba a noiva com uma tremenda bofetada. Ela cai longe, com os lábios sangrando. Enquanto ele a contempla e espera, a pequena, de rastros, com a boca torcida, aproxima-se. Está a seus pés. Abraça-se às suas pernas, soluçando:
Esperei tanto por essa bofetada!