"Com a instituição do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), houve queda na taxa de mortalidade por acidente de transporte terrestre (ATT), entre 1997 e 2000, mas a taxa aumentou na década posterior, indicando limitação da capacidade desta legislação produzir resultados. Motociclistas do sexo masculino, pretos e pardos tornaram-se as principais vítimas", diz pesquisa da ENSP. A afirmação vem do artigo Mortalidade por acidentes de transporte de trânsito em adolescentes e jovens, Brasil, 1996-2015: cumpriremos o Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 3.6?, que analisa as principais características da mortalidade por ATT no Brasil, 1996-2015, com foco na faixa de 10-29 anos.
O estudo teve duas etapas articuladas: revisão bibliográfica sobre o tema violência no trânsito no Brasil; e estudo da mortalidade por ATT no Sistema Integrado de Multas (SIM). Os autores Marcelo Rasga Moreira, José Mendes Ribeiro, Caio Tavares Motta e José Inácio Jardim Motta, do Departamento de Ciências Sociais (DCS/ENSP), concluíram que, de 1996-2015, morreram por ATT cerca de 39.000 pessoas/ano, das quais cerca de 13.200 adolescentes e jovens. "Para atingir o ODS 3.6, o país deve reduzir a mortalidade para algo em torno de 19.500/ano e, entre adolescentes e jovens, para 6.500/ano."
De acordo com o artigo, por tratar-se de um problema global, a violência no trânsito recebeu especial atenção da Organização das Nações Unidas (ONU), que a incluiu nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e na Agenda 2030, via meta 3.6: até 2020, reduzir pela metade as mortes e os ferimentos globais por acidentes em estradas.
No Brasil, de 1996 a 2015, morreram 21.057.086 pessoas, das quais 2.656.875 por Causas Externas (12,6%). Dentre as Causas Externas, os ATT aparecem como a segunda causa mais recorrente, sendo responsável pela morte de 733.120 pessoas (27,6% das mortes pela causa e 3,5% do total de mortes no período). “Do total de mortes por acidentes de trânsito, 264.643 (36,1%) foram de pessoas na faixa etária de 10-29 anos, o que significa que, no Brasil, de 1996 a 2015, morreram, por ATT, em média, 36 jovens/dia.”
Os autores ressaltam que, no caso da violência no trânsito, não se pode discutir medidas de enfrentamento que não analisem, dentre outras, questões de: saúde do trabalhador (motoboys e outras categorias de motoristas têm elevada exposição à ATT); saúde mental (tanto no que tange às condições psicológicas para dirigir quanto ao uso de álcool e outras drogas); má-conservação das estradas e vias públicas; valorização midiática da velocidade dos carros e da audácia dos motoristas; políticas públicas e ações da sociedade que cobrem da indústria automobilística o desenvolvimento de veículos seguros e providos de tecnologias de prevenção de acidentes; transporte público, mobilidade urbana e cidades sustentáveis; e políticas de educação no trânsito, para motoristas e nas escolas.
Reduzir a mortalidade no trânsito pela metade, até 2020, como estabelece o ODS 3.6, é uma meta audaciosa, alerta o artigo. “Neste contexto, o Brasil apresenta-se como um país em que este tipo de mortalidade tem taxas impactantes que, nos últimos 20 anos, mantêm-se estáveis.”
Para os autores, a interação dos ODS – concretizada por meio da formulação, implementação, execução e avaliação de ações, programas e políticas públicas – é uma estratégia que, por ser intrinsecamente intersetorial, é capaz de articular esforços, reduzir custos, integrar recursos humanos, analisar questões sociais de maneira articulada (superando a visão de se trabalhar cada questão de maneira isolada), reunindo potencial para funcionar como uma agenda nacional que oriente as políticas públicas e, propicie o atingimento do ODS 3.6.
O artigo Mortalidade por acidentes de transporte de trânsito em adolescentes e jovens, Brasil, 1996-2015: cumpriremos o Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 3.6? está disponível na revista Ciência & Saúde Coletiva (vol. 23 n. 9), de setembro de 2018.