Como parte da 1ª Conferência de Promoção da Saúde da Fiocruz, que aconteceu na Tenda da Ciência, na segunda-feira (8/4), o ex-presidente da Fundação e diretor do Centro de Relações Internacionais em Saúde, Paulo Buss, apresentou a palestra magna Promoção da Saúde, atenção básica e interface com a Agenda do Desenvolvimento 2030 e seus ODS.
Em sua fala, Buss apresentou a promoção à saúde como uma das principais estratégias a atenção primária em saúde, Buss destacou quatro marcos internacionais da trajetória desta abordagem: a Conferência de Alma-Ata, em 1978, a Carta de Ottawa, em 1986, a Conferência de Astana, em 2018 e a Agenda dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecida pela ONU em 2015.
“É preciso entender a promoção à saúde não só com foco no indivíduo e no que conhecemos como comunicação em saúde, mas como uma forma de olhar para a saúde como um todo”, explicou.
Alma-ata: um marco na saúde
A Conferência de Alma-Ata, que ocorreu no Cazaquistão em 1978, é considerada um marco fundamental na história da saúde. Nela, pela primeira vez, a Atenção Primária foi reconhecida como função central e foco principal dos sistemas de saúde. Além disso, sua declaração reafirma a saúde como um direto humano fundamental e “a mais importante meta social mundial”.
“Alma-Ata é também uma crítica à ineficiência e à ineficácia dos sistemas de saúde de então e ao modelo praticado pela Organização Mundial da Saúde, que se organizava por campanhas de erradicação de doenças”, explicou Buss, que esteve na Conferência, onde também foram reconhecidas as profundas desigualdades entre os países e no interior dos mesmos e se estabeleceu a meta de “Saúde para todos” até 2000.
“Foi uma reunião sem precedentes”, resumiu o ex-presidente da Fiocruz. “Acessibilidade universal, equidade, integração da prevenção e tratamento, responsabilidade do governo pela saúde das populações e participação da comunidade estavam no centro do debate”.
Astana: a reafirmação de um compromisso
Quarenta anos depois dessa conferência histórica, em 2018, uma nova conferência, também no Cazaquistão, buscou reafirmar os seus preceitos. “A Conferência de Astana teve como objetivo reafirmar o compromisso com a Atenção Primária em Saúde, mas de forma compatível com o atual momento, tendo como foco a Agenda 2030 e seus objetivos”, explicou Buss, que foi um dos representantes do Brasil no evento.
Em seu documento final, conferência destacava a “cobertura universal” como a principal meta a ser atingida. Os representantes do Brasil no evento, no entanto, colocaram algumas críticas a esse conceito, preferindo se referir à ideia de acesso universal, em consonância com o preceito de universalidade do SUS. Esta posição foi exposta em documento entregue aos participantes da reunião e publicado na revista Cadernos da Saúde Pública.
Conferências sobre promoção à saúde: de Ottawa a Shangai
A Conferência de Ottawa, em 1986, foi a primeira Conferência Internacional sobre Promoção à Saúde e estabeleceu, em sua carta final, campos de ação para a área. De acordo com o documento, a promoção à saúde consiste em: elaboração e implementação de políticas públicas saudáveis, criação de ambientes favoráveis à saúde, reforço de ação comunitária, desenvolvimento de habilidades pessoais e reorientação dos sistemas e serviços de saúde.
Após essa primeira conferência, outras oito foram realizadas em diferentes partes do mundo para abordar cada um desses aspectos e seus desdobramentos. O reconhecimento de que a promoção à saúde depende de um esforço intersetorial de diversas políticas e de que eram necessários ambientes saudáveis para uma população saudável foram algumas das principais contribuições das conferências de Adelaide, Sundsval, Jakarta, Cidade do México, Bangcok, Nairobi, Helsinque e Shangai, segundo o ex-presidente da Fiocruz.
A partir dessas discussões, as políticas de trabalho, previdência, educação, habitação, saneamento, entre outras, passaram a ser reconhecidas como políticas que interferem na saúde da população. Estes múltiplos fatores são conhecidos como os “determinante sociais da saúde” e foram debatidos em uma conferência própria, realizada em 2011, no Rio de Janeiro, que produziu como documento final a Declaração Política do Rio sobre Determinantes Sociais da Saúde.
Outros aspectos importantes trazidos por essas conferências foram a reafirmação da importância da ação comunitária, da comunicação em saúde e da reorientação dos sistemas de saúde, com foco na atenção primária, para a promoção em saúde. “Comunidade e justiça social são dois conceitos norteadores para a promoção da saúde”, afirma Buss.
Agenda 2030
Atualmente, a ONU coloca como sua principal agenda a implementação dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030. Traçados para após o fim do prazo dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), em 2015, os ODS foram aprovados por todos os Estados-membros das Nações Unidas em sua Assembleia Geral e representam um esforço conjunto para lidar com os maiores desafios do mundo.
“Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável apresentam como característica a interpenetração. Geralmente, eles são apresentados lado a lado, mas para mim, a melhor metáfora para demonstrar esse aspecto é a do quebra-cabeça”, define Paulo Buss.
O Objetivo 3 trata especificamente da saúde, no entanto, o tema também está presente, direta ou indiretamente, em todos os outros objetivos. A saúde é considerada, ao mesmo tempo, uma pré-condição, um resultado e um parâmetro para o monitoramento da Agenda 2030.
O desafio no momento é fazer com que esta Agenda seja conhecida e chegue aos territórios. Buss chama de “localização” este processo de levar em consideração os contextos subnacionais para realização da Agenda 2030, o que inclui a definição de meta locais.
Buscando contribuir para esse processo, a Fiocruz estabeleceu em 2017 a Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 (EFA2030). Coordenada pelo ex-presidente Paulo Gadelha, e EFA2030 tem entre suas ações a promoção de Territórios Saudáveis e Sustentáveis junto às comunidades tradicionais.